Nos dias 25 e 26 de março, o Departamento de Educação Básica (Debasi)
do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), em parceria com a
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), deu início ao
ciclo de palestras e mesas redondas “Integrando Saberes no INES”,
voltado para servidores do instituto. Em seu evento de abertura, a
iniciativa da Comissão de Estímulo à Formação Continuada e Difusão de
Pesquisas e Ações dos Educadores do INES, recém-criada pelo Debasi,
contou com a presença do professor Carlos Skliar, da Faculdade
Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), referência no estudo da
educação e surdez.
No total, cerca de 300 pessoas compareceram ao encontro. As
atividades tiveram início na tarde de quarta-feira, dia 25, quando o
auditório lotado assistiu à apresentação da comissão, composta pela
diretora do Debasi, Amanda Prado Ribeiro, e pelos professores Tiago
Ribeiro, Lívia Buscácio e Luciana Andréia. Também fizeram parte da mesa
de abertura o chefe de gabinete do INES, Paulo Roberto do Nascimento, e a
diretora do Departamento de Ensino Superior, Leila Dupret.
À noite, o professor Carlos Skliar ministrou a palestra “Desobedecer a
linguagem na educação de surdos”, em que abordou questões presentes em
seu livro “Desobedecer a Linguagem”, lançado no ano passado. Skliar
expressou sua alegria em voltar ao INES depois de anos e falou sobre o
trabalho com a comunidade surda, tema sempre presente em sua carreira.
“Percebi que eu não queria mais representar os surdos diante dos
ouvintes. Eles podem representar a si próprios. Não é questão de ‘dar
voz’, mas de ir até onde eles já estão conversando”, disse.
O escritor destacou a importância da conversação na educação,
lembrando que atualmente a publicidade e o consumo tira das pessoas o
tempo para conversar: “Se eu não converso, eu não educo. Há duas décadas
é a linguagem jurídica, da lei, que domina a educação. É dado o
direito, mas não há conversação. O outro não cabe, não tem voz. A
linguagem da educação deve ser a da ética, pois a ética é uma forma de
ver; é uma responsabilidade com o outro e com o mundo, não uma virtude”.
Skliar também citou os filósofos Nietzsche e Hannah Arendt: “A
igualdade é o amor à primeira vista – te vejo e já te reconheço como
igual, semelhante (não idêntico). Educar talvez seja não manchar com o
olhar. Tem a ver com amar o mundo o suficiente para não permitir que ele
se acabe, e amar os outros para que eles não fiquem abandonado à
própria sorte”, frisou, ressaltando a importância de se ter um interesse
verdadeiro na vida do outro, seja ele quem for, para passar o
conhecimento adiante, fazer “valer a pena” e “deixar em paz”, para que o
outro faça o que quiser com o que aprendeu.
Durante o debate que se seguiu à palestra, mediado pela professora
convidada Carmen Sanches, da UNIRIO, e pelo professor do INES Tiago
Ribeiro, Carlos Skliar respondeu a perguntas da plateia e lembrou que o
empo de quem ensina é diferente do tempo de quem aprende. “O professor
não deve acreditar no ‘normal’, que algo é ‘natural’ e por isso não pode
ser mudado”, acrescentou.
Na quinta-feira, o tema da palestra foi “Educar como Travessia”,
baseada no livro “O Ensinar enquanto Travessia”, também de 2014. Skliar
comparou o ato de educar a uma viagem com os outros e através dos
outros, divididas em “estações”, e fez uma defesa da escola pública –
não a instituição pela instituição, mas pela sua natureza. “Hoje há
ataques contra a escola pública e, principalmente, contra o público da
escola. Mas a escola é um lugar público, onde acontece o que não é
segredo, o que se mostra, o que é comum a todo mundo e independe das
diferenças individuais”, observou.
Segundo o professor, a palavra “ensinar” (insignare, no
latim) tem que ser recuperada. “Ensinar é dar signos; assinalar, mostrar
tornar visível alguma coisa para o outro. Mas, depois de dados, é o
outro que vai decifrá-los – ao seu tempo e ao seu modo”, explicou. Ele
também lembrou que a diferença não fica no interior de um sujeito, mas
na relação entre os sujeitos: “Existe diferença entre os sujeitos, não
sujeitos diferentes. (…) Por isso, independentemente de quem sou eu e
quem você é, devemos fazer outras coisas juntos”.
Antes do segundo debate do evento, mediado pelas professoras Marise
Gomes e Vanessa Miro, Carlos Skliar ainda aprofundou a discussão sobre o
tempo livre e o tempo “útil”, de trabalho, conceitos já trabalhados por
sociólogos e filósofos. “A escola não está feita, pronta. Ela tem que
ser construída a cada dia, no gerúndio (…). A escola precisa de tempo.
Quando a gente não tem tempo, precisa da normalidade. Quando tenho tempo
para conversar não julgarei o outro. Como diz Hannah Arendt, educar é
doar tempo para o outro”, concluiu.
Ao final do ciclo de palestras, foram sorteadas três obras do autor,
incluindo uma caixa de poemas. Nesta vinda ao Rio de Janeiro, Skliar
ainda participará de eventos na UNIRIO, na Universidade Federal
Fluminense (UFF) e na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj)
até o dia 1º de abril.
Ciclo de palestras
A Comissão de Estímulo à Formação Continuada e Difusão de Pesquisas e
Ações dos Educadores do INES já está definindo o calendário de eventos,
com datas até o fim do ano. “Vamos promover palestras e mesas redondas
uma vez por mês, sempre às quintas-feiras, com profissionais das
diversas áreas do conhecimento que desenvolvem pesquisas no campo da
surdez. Estamos muitos felizes por começar já com chave de ouro, com o
professor Carlos Skliar”, contou a diretora do Debasi, Amanda Ribeiro.
De acordo com Amanda, a ideia do ciclo de palestras surgiu de uma
demanda dos próprios docentes do instituto. “Percebemos o interesse
durante nossas reuniões pedagógicas semanais, com professores das turmas
de 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º do Ensino Médio. A princípio o
público-alvo seria só os professores, mas depois vimos que era uma
necessidade da casa e abrimos para os demais servidores”, disse,
enfatizando o apoio recebido da Direção Geral do instituto.
O professor Tiago Ribeiro, destacou como esta troca de experiências e
a formação teórica podem contribuir com o trabalho dos educadores:
“Acredito que nós, professores alfabetizadores, da escola básica,
precisamos cada vez mais nos inscrever e nos assumir nesse lugar de
produção de conteúdo e conhecimento, assim como já acontece nas
universidades”. O próximo encontro do “Integrando Saberes no INES” será
no dia 30 de abril e abordará o tema “Educação e tecnologia”.
http://www.ines.gov.br/index.php/carlos-skliar-participa-de-ciclo-de-palestras-do-ines
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