RYBENINHA

RYBENINHA
SINAL: BEM -VINDOS

DÊ-ME TUA MÃO QUE TE DIREI QUEM ÉS



“Em minha silenciosa escuridão,
Mais claro que o ofuscante sol,
Está tudo que desejarias ocultar de mim.
Mais que palavras,
Tuas mãos me contam tudo que recusavas dizer.
Frementes de ansiedade ou trêmulas de fúria,
Verdadeira amizade ou mentira,
Tudo se revela ao toque de uma mão:
Quem é estranho,
Quem é amigo...
Tudo vejo em minha silenciosa escuridão.
Dê-me tua mão que te direi quem és."


Natacha (vide documentário Borboletas de Zagorski)


SINAL DE "Libras"

SINAL DE "Libras"
"VOCÊ PRECISA SER PARTICIPANTE DESTE MUNDO ONDE MÃOS FALAM E OLHOS ESCUTAM, ONDE O CORPO DÁ A NOTA E O RÍTMO. É UM MUNDO ESPECIAL PARA PESSOAS ESPECIAIS..."

LIBRAS

LIBRAS

LIBRAS

LIBRAS
"Se o lugar não está pronto para receber todas as pessoas, então o lugar é deficiente" - Thaís Frota

LIBRAS

LIBRAS
Aprender Libras é respirar a vida por outros ângulos, na voz do silêncio, no turbilhão das águas, no brilho do olhar. Aprender Libras é aprender a falar de longe ou tão de perto que apenas o toque resolve todas as aflições do viver, diante de todos os desafios audíveis. Nem tão poético, nem tão fulgaz.... apenas um Ser livre de preconceitos e voluntário da harmonia do bem viver.” Luiz Albérico B. Falcão

QUANDO EU ACEITO A LÍNGUA DE SINAIS

QUANDO EU ACEITO A LÍNGUA DE SINAIS
“ A língua de sinais anula a deficiência e permite que os sujeitos surdos constituam, então, uma comunidade linguística minoritária diferente e não um desvio da normalidade”. Skliar

sexta-feira, 18 de abril de 2014

UMA REFLEXÃO MUITO SURDA


Remoendo minhas memórias no meu HD externo de 1 terrabyte da Samsung, lembrei-me de um processo pelo qual passei em minha vida surda que desejo compartilhar com vocês, membros da lista, especialmente os que de certa forma se embrenham à força na comunidade surda.
Quando eu era criança e ouvia com meus ouvidos ouvintes, lembro-me vivamente que, como qualquer outra criança, interagia normalmente com meus colegas e como ouvinte, ouvia-os falar, gritar, brincar, peidar, arranhar as paredes, cantar, arrotar, tossir, espirrar e vomitar além de muitos outros sons que só lembro se vasculhar bastante meu mundo psíquico.
Lembro de muitas vozes em particular como se as tivesse ouvido ontem, apesar de já terem se passado mais de 30 anos. E lembro que essas vozes diziam muitas coisas, que havia uma espécie de socialização na sonoridade que me dizia quando eu era aceito e quando eu era rejeitado por um grupo, uma dupla, um indivíduo. Lembro inclusive quando tinha
cerca de 3 anos de idade e na fila para voltar à sala após o recreio, fui "dar em cima" de uma coleguinha da escola, dei-lhe um beijo ousado na bochecha (bom, não fui o único) e disse que ela era minha namorada.

Levei meu primeiro fora(devia entrar pro Guiness, recorde aos 3 anos) de uma garota e ouvi cobras e lagartos -- os palavrões que uma criança sabia dizer: "seu bobão". Entendi rapidamente que não era "querido" ali e não arrisquei outra tentativa(bom, não tenho certeza, não lembro mais).
Lembro de um coleguinha que brincava com bonequinhos do velho e bom "forte apache", delírio da garotada de minha época, que eram uns bonequinhos de faroeste. Tentei me sentar ao lado dele para brincar junto, disse a ele que tinha os mesmos bonequinhos em casa e a gente podia juntar tudo e brincar junto, mas o rapaz era muito enfezado, nem quis saber e mudou a voz, foi me enxotando dali. Era outro sinal que também não era querido por ali.
Meus amigos e coleguinhas sempre gritavam meu nome na hora do recreio, nas escadarias de meu prédio, na rua da casa de minha avó. Gritavam meu nome "Ei Marcos você tá aí? Vamos jogar! Vamos brincar! Estamos te esperando aqui fora". Lembro-me que era muito querido pelo desajeitado time de futebol da escola, sempre era eleito o zagueiro, o atacante, sempre era escolhido primeiro na divisão dos times. Ouvia alguém dizer: "Eu quero o Marcos", "Marcos no meu time", e coisas do gênero.
Na hora do recreio na escola, começava a brincadeira de pega-pega. Eu fazia as vezes de lobo mau, o cachorro doido, o ladrão malvado, o monstro, o bicho papão, e ia atrás da meninada que corria para o "pique" e se salvava(de vez em quando eu era mais rápido e pegava uns) Ia para o sítio e ouvia grilos, morcegos, sabiás, o trem de ferro, além dos tiros das espingardas de chumbinho caçando passarinhos. O povo da roça me chamava para ver - e ouvir - os tristes animais agonizando. Ouvia a voz imperativa e militar de meu avô me chamando na sala, querendo saber o que eu estava fazendo(quebrando) martelando na varanda; ouvia a voz doce de minha avó contando estórias da bíblia. E ao dormir no quarto de
meus pais(de vez em quando eu ficava carente), tentava identificar a marca e modelo dos carros ouvindo-os passar ao longe pela rua. Certa vez ouvi um ladrão entrando em casa e meu pai correu atrás dele com um enorme bastão, mas ficou com dó quando viu que era menor de idade e deixou ir embora. Conversava com meus pais deitado na cama de meu
quarto, eles na sala de tv. E ouvia os discos de vinil, música sertaneja do Sérgio Reis, rock do Elvis e MPB de muitos brasileiros nos finais de semana na casa de meus avós, tendo em contrapartida que aturar a voz estridente e desafinada de minha pequena irmã caçula querendo imitar os figurões da música. E muito importante é que me lembro claramente da voz de minha professora e de meus colegas em sala de aula, quando aprendi a ler e escrever. A professora tinha uma voz forte e possante, que eu achava estranho para uma mulher, talvez eu fosse machista, não sei, fazia ela parecer maior e mais poderosa do que realmente sua compleição física acusava. Mas interagia maravilhosamente em sala de aula, perguntando bastante, sempre ativo no aprendizado e tinha excelentes notas (até ficar surdo).
Lembro-me inclusive de um colega de feições orientais que reclamou comigo e com a professora, com sua vozinha fininha, que não era japonês coisa nenhuma, era brasileiro legítimo, nascido e criado no Brasil, só o pai e o avô eram japoneses mas ele não. 
A professora, com aquela voz possante, repreendeu-me, mandou que eu parasse de chamá-lo de japonês, e que toda turma se referisse a ele pelo nome, não pela ascendência nipônica. Bom, lamento pular lacunas, mas oque queria dizer nesse fim de parágrafo é que milhares de vozes ainda pululam por minhas reminiscências. São bonitas como a infância saudosa, nostálgica, que se foram e não voltam mais. Pelo menos para mim, é assim que funciona.
Então um dia, tudo se silenciou bruscamente. Mas estas vozes não cederam assim de repente. Elas se projetavam em cada movimento labial, estranhamente. No início eu confundia essas alucinações com vozes reais e achava que minha audição ia e vinha. Mas com o tempo fui percebendo que essas vozes não estavam sincronizadas com a fala das pessoas. Também notei que o sabiá que ouvia insistentemente toda manhã ao acordar, não existia, na verdade, nunca existiu. Procurei bastante por esse sabiá,pelas árvores do hospital até as árvores ao redor de minha rua. E o procurei na casa de meus avós, mas quando me deparei com um sabiá de verdade, percebi que não o ouvia. As pessoas o ouviam e eu não.
Certo dia ouvi um grilo e procurei assustado debaixo da cama, procurei pela casa até que minha mãe desesperada finalmente disse que não ouvia nenhum grilo. Assim me dei conta que tudo não passava de alucinações.
Alucinações auditivas. Pena que não me contaram que eu era surdo porque os ouvintes gostavam dessas confusões minhas, dava esperança para eles. 
Fazia eu parecer menos debilóide, menos doente, menos aleijado, menos o que eu realmente era. Mas vamos aos fatos. Quase imediatamente me arrumaram um aparelho auditivo e depois de uns tempos, meu pai labutou, juntou dinheiro e comprou outro, fiquei com dois. Mandaram-me usá-lo, principalmente na escola e até mandavam a professora que tinha aquela voz -agora despossante, sem som, só a boca mexendo- conferir se eu os usava todas aulas. Tranquilizaram-me dizendo que eu voltaria a ouvir, só não sabiam quando, quem me tranquilizou: a fonoaudióloga A, a fonoaudióloga B, a fonoaudióloga C e os muitos funcionários e representantes comerciais da loja de aparelhos auditivos, inclusive o cara que fazia os moldes de acrílico para enfiar no ouvido. Quem disse que era irreversível minha surdez: o médico otorrino (que me disse terminantemente: "você, por tempo indeterminado, ficará surdo. Sua surdez é profunda e irreversível."), e a psicóloga, essa última vivia me  perguntando: "você sabia que você é surdo? você não escuta esse rádio, escuta? E esse
tambor? E esse pandeiro? E esse tiro de revólver de espoleta?", ela vivia me flanqueando e armando emboscadas bem elaboradas quando brincávamos de faroeste no consultório com revólveres de espoleta, para me mostrar que eu não era capaz de ouvi-la chegando sorrateiramente, mas logo fiquei esperto e a surpreendi várias vezes que ela chegou a duvidar
se eu tinha realmente ficado surdo.
Bom esses dois últimos profissionais eram em menor número e apesar de não ser democracia na época da ditadura, ninguém acreditou na verdade deles, inclusive eu, que era
pequeno e burro demais para contrariar meus pais. Então depois disso aí eu voltei para a escola.
Na escola, tudo mudou. Mudou como se fosse da noite para o dia. Virei um ET mais feio que o de Varginha, um leproso dos tempos dos Gregos, igual aqueles que Jesus curava(inclusive até hoje ainda não entendi porque Jesus tocou a língua do surdo com saliva/cuspe e falou Effatá, precisava falar que o surdo estava juntando cuspe? Fica parecendo que nós somos nojentos na bíblia). Claro que não ouvi mais nenhuma voz me chamando. 
Fiquei completamente isolado em mim mesmo, as únicas pessoas que se relacionavam comigo eram Deus, os professores, as paredes, meus antepassados(igual o Fantasma na caverna da caveira) e minha família. Ninguém mais queria saber de mim, ninguém tinha paciência ou coragem ou sabe-se lá o quê -- já se passaram tantos anos -- de se aproximar de mim ou mesmo me interpelar. E esta solidão era uma tortura, mas também eu tinha meus momentos de rebeldia, de piração, de estourar e brigar com o mundo inteiro.
Me revoltava e gritava na sala que não era doente e pedia o mesmo tratamento destinado ao "japonês" que a professora mandou todo mundo chamar pelo nome e até voltava para casa não querendo mais brincar de "não ouvir", querendo que tudo acabasse logo e voltasse ao normal. 
Não sei nem se a professora fez algo a respeito, pois a essa altura já não sabia o que ela falava, só ficava lá na escola, largado, sentado na carteira escolar olhando em volta esperando o tempo de escola acabar. E na hora do recreio ficava na minha, tentava correr atrás de algum coleguinha que corria de mim não para brincar, mas para desaparecer de meu alcance e de minha vista.
Lia as expressões faciais e corporais e entendia que não era mais aceito ali. E li essas expressões corporais e faciais por 30 anos, sempre soube que não era mais querido nesse mundo dos "ouvintes". Mas por muitos anos me recusei a aceitar isso. Insistipara mim  mesmo que ainda era alguma coisa "humana", não Extraterrestre, não doente de lepra, não repressiva e merecia a companhia dessas pessoas ouvintes. E também fazia umas coisas, eu pensava..........que talvez um dia pudesse mudar os ouvintes e um dia eles teriam de me aceitar e me engolir.
Levei bastante tempo para amadurecer. Mais de duas décadas. Então o que fazia? Logo que aprendi leitura labial, treinei como doido, gravava inúmeros vídeos de apresentadores de TV (misturados com alguma pornografia eventual que eu necessitava para eliminar a pressão da libido adolescente), me trancava no meu quarto, passava horas revendo e anotando tudo que entendera, até ficar com dor de cabeça e ir jogar videogame ou estudar Batman, o cavaleiro das Trevas, de Frank Miller. 
Pedia bastante ajuda a meu pai para esse treinamento, talvez seja por isso que eu entenda ele falando oralmente de qualquer ângulo e isso lhe dá a falsa impressão que eu sempre fui "capaz" de ler os lábios de qualquer pessoa, não necessitando de usar a "linguagem dos gestos "mímicos".
Pena que essa analogia não funcionou para todos que conheci, principalmente os professores. Me ferrei bastante no ensino médio e tive uma penca de professores particulares. Me ferrei mais ainda no relacionamento social, por confiar cegamente na leitura labial, passando por numerosos constrangimentos comunicativos. Não sei precisar tampouco
computar nem mesmo com fórmulas, matrizes e determinantes ou ainda nos limites das diferenciais e das integrais, nem projetar no gráfico o balanço estatístico da extensão do prejuízo cognitivo, emocional, espiritual, cósmico e galáctico que dimensiona a incompreensão que fui acometido por muitos anos em minha vida. Pois nem inclusivas ou
exclusivas essas escolas de minha época eram, eram escolas foda-se-sivas. Na escola normal o surdo não tinha vez, pior que o japonês(o brasileiro da minha sala) e o chinês(do provérbio).
Mas no âmbito social, para me relacionar com terceiros, era uma correria. Eu ia atrás de todos ouvintes, colava neles até me aceitarem, virava imã, chiclete, mala sem alça, super bonder, o que fosse até que as pessoas me aceitassem pelo desgaste e pela fadiga, ficando impossibilitados de me chutar para fora do grupo. Ia na casa dos colegas, conhecidos e "amigos" sem avisar -- e eu ia fazer o quê? Ligar para eles por telefone? -- e em alguns lugares logo fui percebendo ser um incômodo.
Quando as pessoas começavam a me evitar e a fugir de mim, finalmente dei no pé chutando a bola pra frente. Acordei para a realidade. Percebi que eu era uma espécie de transtorno bipolar ambulante, um estorvo para as pessoas que pretendiam se ver livres de minha presença surda. Assim passei a conviver somente com aqueles que não me rejeitavam -- pelo menos os que não declaravam isso explicitamente.
Mas aí um dia conheci a surdarada. Nas associações não fui aceito logo de cara, levou um tempo, mas entre pessoas físicas e jurídicas era o maior prazer me ter entre eles. Então entendi que haviam outros da tribo dos Moicanos, que agora esse era meu "mundinho", o "povo ao qual pertencia", o "grupo certo", a "raça pura", "o endereço certo do gueto", que eu teria que fazer fofoca, que precisaria casar com surdo e ter filhos surdos, essas coisas.
Me entrosei com a surdarada e um dia realmente caí na real, a ficha do orelhão do TDD caiu, o fichário despencou e ao cair da cama, rolei no chão e me dei conta que não precisava mais correr atrás dos ouvintes. Pois os surdos vinham a mim espontaneamente -- inclusive muitas vezes inconvenientemente sem ser convidados aparecem na porta de casa -- e eu vou espontaneamente a eles, como uma troca interativa construtiva. Existe um apreço mútuo, uma socialização que nunca antes experimentei como "meio ouvinte-meio surdo". Então passei a me sentir normal com a surdarada.
Chutei a bola dos ouvintes de volta para eles e toquei minha vida para frente. Parei de chamar os ouvintes para sair, parei de ir na casa deles e meses depois quando começaram a ligar para minha casa achando que eu tinha morrido num acidente, eu apenas pedia aos meus familiares que respondessem : ele foi trabalhar, ele está estudando, ele não está, ele está muito ocupado, ele viajou e só volta na próxima vida. Simplesmente perdi a vontade, sabem? Cansei de fazer o papel do babaca chato.
Abracei a LIBRAS, e descobri que não sentia mais dor de cabeça tendo que forçar a vista a cada aula oralizada. Ninguém me mandava mais usar aparelhos auditivos. Entre os surdos não tive mais lepra nem desci de disco voador, quanto mais tive minhas alucinações delirantes paranóicas.
Graças a Deus porque senão não conseguiria continuar minha vida com toda aquela pressão para ser uma coisa que eu hoje estou profundamente seguro que não sou mais: ouvinte.
Nada contra os ouvintes, bem, mais ou menos. Mas tudo contra a humanidade. Nós, humanos, somos uns pobres coitados, uns pobres diabos. Vemos uma verruga cabeluda enorme no queixo de um cara e começamos a pensar coisas negativas e nojentas sobre o que tem naqueles cabelos que pode sair de lá e nos atacar.
Nos afastamos das pessoas com herpes oral mesmo que seja só uma feridinha de uma espinha ou um corte nos lábios, nem ousamos perguntar. E nem queremos chegar perto dos que têm conjuntivite porque se a pessoa piscar, uma gota contaminada pode pular para seu olho. Não apertamos as mãos dos aidéticos de bom grado sem lavar depois; não encaramos os negros sem medo de um assalto; não sabemos direito o que fazer diante de uma pessoa careca com câncer; fechamos a janela do carro para os pedintes que podem enfiar um caco de vidro no seu pescoço; corremos dos vira-latas que pedem carinho; pior, mandamos recém-nascidos para a lixeira.
Mordemos bebês de poucos meses, atiramos em crianças de 2 anos. Exterminamos os judeus; fuzilamos os xiitas e os sunitas que depois montam emboscadas com carros bomba.
Estupramos crianças e bebês. Queimamos as Hermiones Granger, as Minervas McGonagall, as Madame Mim, as Blair, as Salem, as Joanas D’Arc na fogueira da ignorância e as que sobreviveram, castramos seus clitóris e as subjugamos ao domínio machista com a burka e sem poder rezar a missa como padras nem serem arcebispas ou papas. Por quê, meu Deus?
É porque somos predadores, é nossa natureza animal. Somos carnívoros, na verdade somos onívoros, precisamos comer tudo e comemos até nós mesmos, inclusive tem gente que come pedras da rua e bebe gasolina. Controlamos essa natureza com conhecimento, repressão emocional, tentamos fantasiar que vivemos num mundo seguro e bom, e que temos um Deus acima de nós para nos refugiar e consertar nossos atos para podermos seguir o caminho da retidão esquecendo que uivamos à noite quando vemos outro homem.
               Então não devemos esperar que todos sejam legais uns com os outros nem que não queiram fazer sacanagens uns com os outros, mas precisamos viver em sociedade e para isso é preciso segurar os impulsos maléficos. Independente da religião, ideologia e todo besteirol que desejamos propagar, somos malvados e até gostamos disto. Existe uma espécie de perversão em ser humano e ter um conhecimento amplo de como fazer uma série de coisas com as pessoas, os animais e outras coisas vivas e mortas.
Então vou saindo dessa aura de embromação e chegando aos finalmentes. Bom, o que vim dizer aqui não era sobre exatamente a tortura e a decepção de uma vida surda. É sobre as escolas bilíngues, inclusão e coisas muito mais siderais, digo, sérias.
Caros discussintes, há pessoas que precisam tirar a mão do compartimento da ficha do orelhão, deixar a dita cuja cair de uma vez. Pessoas precisando cair na real.
Entrei pelo cano e vi uns vídeos de umas bravas gentes brasileiras. Percebi que tá na cara que tem gente que não sabe LIBRAS nem quer saber de LIBRAS porque no vídeo vai tentando fazer LIBRAS devagar enquanto tenta lembrar do vocabulário, que não sabe, um vocabulário muito parco e preso na língua portuguesa, que absurdo que existam pessoas que, com esse pouco de conhecimento, possam ensinar LIBRAS ou quanto mais serem intérpretes.
Não fiscalizam o PROLIBRAS contra esses absurdos? Onde está a polícia para isso, o ministério público? Ah, lembrei, não sabem LIBRAS. Tem gente que fala que a LIBRAS não tem sinal porque não sabe usá-la para o conteúdo que pretende sinalizar, vai ver ficam esperando para sinalizar porque tem uma pessoa mais habilitada por trás, fazendo "espelho". São pessoas assim que fazem um BIMODALISMO descarado até finalmente suprimir toda sinalização e falar oralmente impondo sua vontade ulterior de suprimir a liberdade surda, talvez sintam o gosto perverso de achar que os surdos se resignam a essa inapetência.
Tem gente que quer é que a comunidade surda seja domesticada conforme seu jeito de ver o mundo e desprezar a LIBRAS. Gente assim precisa acordar como o Robert De Niro em Tempo de Despertar, mas talvez sejam necessárias umas duas toneladas de levodopa.
Nós não queremos saber de gente assim faz milhões de anos. Não entendo porque essas pessoas não vão cuidar de suas vidas e trabalhar com alguma coisa onde alguém as
queira. Ou fazer um curso de LIBRAS legítimo e aprender de vez a usar essa língua sem misturar o português junto até o Manoel comer toda sinalização.
E digo mais: certo dia um irmão de um surdo veio me encontrar para falar dar depoimento sobre as dificuldades do irmão. Acabou que o cara me passou um monte de folhetos de cursos de prevenção à gravidez, cursos de aprendizagem sobre como desenvolver a mente, sobre como aprender a viver em sociedade e ir ao banheiro, sobre como aprender português, sobre como aprender a costurar as roupas, sobre como aprender a ir no médico e como conversar com as pessoas e um monte de coisas bestas. E me disse que eu tinha de divulgar esses cursos para os surdos de todo país pois os
mesmos(ele generalizou "todos os surdos") viviam errada e burramente. 
Olha só gente, esse cara achava que todos surdos podem ser julgados somente pelo que ele viu de defeitos no irmão dele.
E um outro cara disse há pouco tempo para um político que nós surdos não entendemos as coisas que os ouvintes dizem porque (ficou implícito na insinuação dele) temos problemas mentais -- mesmo tendo um intérprete. Porque esse cara tinha um filho com surdez e mais algum comprometimento cognitivo. Ele achava que todos nós podemos ser julgados em função dos problemas do filho.
São pessoas assim que devem entender que não são ninguém para dizer o que devemos ou não fazer, principalmente se não entendem o bastante da LIBRAS e da comunidade surda.
Não podem nos julgar em função do surdo com quem conviveram e se frustraram. Não somos todos iguais a esse surdo e lembrem que há ainda ouvintes com suas questões cognitivas e dificuldades de desenvolver.
Cada surdo, como qualquer ouvinte, é único e tem sua história de vida, sua subjetividade particular, cometeu seus pecados próprios e tem seus lugares garantidos no inferno, no purgatório ou no céu.
Não pensamos nem somos como uma massa de pão de queijo uniforme. Pensamos e agimos cada qual do nosso jeito, sejamos coxinhas diferentes de diferentes lanchonetes, sejamos pastéis de carne de diferentes bares copo sujo.
Nos identificamos por nossa história de vida com alguns fatos parecidos, mas nos diferenciamos por outros. E na nossa história de vida nem todos nós nos ferramos e na escola regular. Eu sim, e milhares de outros surdos também se ferraram, mas isso porque existiam muitos professores que nos julgavam pelo viés da ignorância.
Somos nós que defendemos a escola bilíngue que irá construir o lado iluminado da força Jedi, nossa identidade, nossa auto estima, que pretendemos disseminar, como no caso
específico e isolado da minha vida, as possibilidades de libertação, alívio e felicidade de se encontrar e se fazer na LIBRAS -- quando sabemos utilizá-la adequadamente e conhecemos seu alcance.
Não há um dia que eu deixe de sonhar como tudo poderia ter sido diferente. Mas não precisa ser a desgraça amaldiçoada do inferno com pessoas assim se metendo onde não foram chamadas e dizendo o que não sabem. Metendo o nariz onde ninguém as quer. Lendo o jornal alheio que eu paguei com o suor do meu sovaco, pelas minhas costas. Estas pessoas
podem até continuar insistindo e teimando, sei que vão, mas dou esse conselho de ouro maciço tirado do Forte Knox dos EUA: vão cuidar de suas vida porque nós surdos usuários e partidários da LIBRAS, partidários e ideologistas da escola bilíngue para surdos queremos dignidade para a surdarada e continuaremos sempre a defender este ponto de vista da escola bilíngue para surdos.
Porque é a escola onde podemos SER, longe e protegidos de gente malcriada que enseja nos moldar de acordo com a filosofia oralista, ouvintista, colonialista e finalmente, ditatorial de que nós sempre devemos ser inferiores, submissos à vontade de pessoas que odeiam os surdos e a língua de sinais. Porque estas pessoas não conseguem viver no meio da "sujeira" das excreções do ouvido, querem HIGIENIZAR os "deficientes" e mandá-los para Azkaban, para o Carandiru, longe do olhar "perfeito" e "limpo" do paraíso cor de rosa que almejam viver.
É tudo uma mera imposição desta visão ideológica sobre a nossa. Nada mais que isso. Um preconceito, um pré-conceito deslavado, que não foi jogado na máquina de lavar roupa.
Por mais que se tente forçar as pessoas a achar o quão inferior e pisável, tal como uma formiga muito pequena que esmagada sai pouco pus, é a língua de sinais, o quão superior e dinossáurica é a língua oral, o quão subjugados devem ser os surdos, nós iremos existir e permanecer para incomodar e cutucar pelas costas quando menos esperarem, interrompendo e avacalhando os planos de assistir ao final da novela.
Nós vamos resistir. Nós vamos continuar.
O poder de nosso intelecto reside nas possibilidades que a evolução das espécies semeou em nosso substrato neural configurando-o para a linguagem.
 A LIBRAS é uma das maiores e mais incríveis criações humanas e não são pessoas quaisquer, com suas revoltas, inaptidão de vocabulário, inveja interestelar de Darth Vader e palavras de desprezo que vai destruí-la como a Estrela da Morte foi explodida. É preciso destruir todos os surdos para isso, o que evidentemente não é possível fazer então sempre haverá frustração e desejo que os surdos se resignem e sejam obrigados a ler os lábios. 
Então é melhor continuar correndo atrás de nós, a correr atrás da LIBRAS, a mendigar na ignorância para onde quer que forem. Um dia terão de aceitar que não são queridos na comunidade surda, por isso não aprendem o vocabulário certo e não conseguem dominar a LIBRAS. Então cuidem de suas vidas, procurem o emprego certo e deixem de profetizar esses absurdos atrapalhados sem o menor fundamento. É preciso ter amor próprio.
Procurem seus iguais, eles devem estar em Marte, Júpiter, Urano, em alguma galáxia muito muito distante, um pouco mais para o centro. Basta juntar uns 5 milhões de dólares e viajar em busca deles, pela VirginGalactic, subsidiária da Virgin Atlantic de Richard  Branson.
Boa viagem!!! Espero que sejam felizes no buraco negro onde são esticados até o infinito e o tempo não anda. Assim permanecerão felizes para sempre.

Autor:    Marcos Antonio de Sousa Junior (Surdo Profundo)- BH-MG
                Especialista em Linguística
                Formado em Psicologia Educacional


http://oficinadelibras.blogspot.com.br/2012/11/uma-reflexao-muito-surda.html

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