31.12 - Por Equipe Plantão Enem

Rosane
As formas de acessibilidade são a grande
preocupação de muitas pessoas com deficiência que vão fazer a prova do
Enem. Para tirar algumas dúvidas sobre o assunto e entender como
funciona o atendimento especial durante as provas, o Plantão Enem
conversou com Rosane Lucas. A jornalista, que além de apresentar o
Jornal Visual na Rede Minas, é intérprete no Exame. Ela conta um pouco
de sua história, as propostas em andamento para melhorar o acesso em
exames e concursos públicos e como anda o mercado de trabalho para quem
domina a Libras.
Plantão Enem: Quando você começou a se interessar pela Libras?
Rosane Lucas: É importante
lembrar que a Libras é uma língua e não uma linguagem! Ela tem estrutura
gramatical e regras, sintaxe, morfologia, com fonologia... Mesmo não
sendo uma língua oral, os aspectos fonológicos dela existem em outros
parâmetros. Eu sou filha de surdos e tenho uma irmã que é surda, uma tia
por parte de mãe e 30 primos surdos por parte de pai. Meu pai sempre
foi militante da Associação dos Surdos e, como eu fui criada nesse
ambiente, aos 16 anos já fui convidada para trabalhar lá e foi quando eu
vi que queria trabalhar na área. Daí comecei a investir, a estudar, a
buscar informação que, há um dez, quinze anos atrás não existia, assim
como hoje a formação para intérprete é muito pouca. Hoje tenho uma
experiência na prática, não de banco de escola.
Plantão Enem: Como surgiu a oportunidade de auxiliar pessoas com deficiência na prova do Enem?
Rosane Lucas: Existe uma comissão
que é responsável pela contratação de fiscais especiais e no caso do
Enem é a ocasião em que mais se precisa de intérprete, porque o
candidato faz as provas em sua região, perto de casa. A organização não
concentra todos os estudantes que precisam de atenção especial em um só
lugar, por isso precisam disponibilizar dois profissionais para cada
escola a cada três candidatos. E aí a gente monta uma rede muito grande
de intérpretes! Chega até a faltar porque a demanda é muito grande!
Plantão Enem: Como funciona o atendimento às pessoas com deficiência no Enem?
Rosane Lucas: Essa é uma questão
ainda muito polêmica porque não existe uma legislação para dar
embasamento para a atuação do intérprete no momento de prova. A prova
vem na língua portuguesa e a pessoa surda é geralmente usuária da língua
de sinais. É como se um americano viesse aqui fazer a prova.
Plantão Enem: Quer dizer que muitos deficientes auditivos dominam mais a língua de sinais que a portuguesa?
Rosane Lucas: É uma outra
língua! A Libras é visual-espacial enquanto que o português é
oral-auditivo. São modalidades diferentes, a estrutura de texto é
diferente... E o papel do intérprete na prova do Enem é traduzir
palavras. A pessoa nos mostra qual a dificuldade na palavra. A gente não
interpreta a prova toda porque são vários fiscais e corre-se o risco de
existirem muitas interpretações e candidatos serem ou não favorecidos. E
outra que, na hora de interpretar, o fiscal especial pode dar uma deixa
para a resposta. O que a gente pensa em termos de pesquisa, e o que a
UFES já tem aplicado, é formular uma prova em língua de sinais. Ela
seria projetada em vídeo e o candidato teria acesso a uma folha com a
pergunta também em português para poder acompanhar. A proposta é que se
implemente esse sistema no Enem num futuro próximo e em outros
concursos, provas e demais processos seletivos. Assim você torna a prova
de fato acessível. Mas já aconteceram muitos avanços! Existe um manual
que é oferecido pelo Enem com orientações para a nossa atuação. É legal
porque o candidato se sente mais confortável até porque a gente ajuda a
interpretar os avisos, o tempo de prova, se o estudante pede para ir ao
banheiro não tem que ficar naquela preocupação do tipo “Nossa! Será que
tem alguém que vai me entender?” O emocional no momento da prova já é
aquela loucura, então se você tem alguém que fale a sua língua, você já
fica mais tranquilo. E essa acessibilidade também é oferecida para as
pessoas com deficiência visual.
Plantão Enem: E como é o atendimento à pessoa com deficiência visual?
Rosane Lucas: Pois é! Essa
experiência eu tive no último ano. Não sei por que a prova da pessoa não
veio em Braile como ela havia pedido, só em tinta. Mas a gente leu a
prova toda para ela! E foi muito bacana porque a gente ficou numa sala
de educação infantil e lá tinha muito material tátil. Na prova de
biologia, por exemplo, que tinham várias gravuras, eu olhava e, enquanto
um intérprete lia o texto, eu tentava “montar” a imagem para que ela
pudesse sentir a forma! Foi uma questão de sorte estar naquela sala! Eu
considero essa uma experiência ímpar.
Plantão Enem: Quem tem deficiência visual pode responder a prova em Braile?
Rosane Lucas: Sim. O candidato
pode responder em Braile. Aí entra a figura do escriba, que é a pessoa
que passa para tinta todas as respostas do candidato. Ele também pode
responder oralmente e, para essas ocasiões a gente tem um gravador, que é
registrado na documentação, e grava a resposta do candidato. Isso ajuda
a resguardar tanto o estudante quanto o fiscal.
Plantão Enem: Agora uma pergunta mais profissional. Quem tem vontade de aprender Libras e trabalhar nessa área, por onde começar?
Rosane Lucas: Hoje temos muitos
cursos de Libras dentro de instituições religiosas – na igreja católica,
evangélica, os Testemunhas de Jeová têm muitos grupos – e tem também as
associações de surdos que oferecem cursos livres, tal como existem os
de inglês e espanhol. A profissão de intérprete [de Libras] foi
reconhecida em 2010, e a gente ainda está traçando a formação do
profissional. Hoje, os que trabalham na área são pessoas que têm
parentes com deficiência ou que se envolvem por motivos religiosos. Mas a
proposta do governo federal é expandir essa formação em nível
médio-técnico. Então, quando o aluno entra no primeiro ano, ele pode
optar por fazer um curso em tradução e interpretação. Ele funcionaria no
mesmo esquema dos cursos oferecidos hoje pelos Cefets – pela manhã o
Ensino Médio e outro turno para desenvolver as habilidades técnicas.
Plantão Enem: Como está o mercado de trabalho nessa área?
Rosane Lucas: O mercado de
trabalho é amplo e necessita de mão de obra. A gente vê isso mesmo agora
na contratação de fiscais! O estado está com duas vagas abertas já faz
um mês e não é por questão de remuneração, porque o salário oferecido é,
em média, R$ 1.200, é falta de capacitação. Uma dica que eu dou para
quem ainda não escolheu a carreira a seguir é essa porque tem mercado!
Com a proposta de inclusão do governo federal os recursos que têm sido
investidos são todos voltados para cursos gratuitos na área.
http://www.plantaoenem.com.br/blog/libras-no-enem-como-funciona-o-atendimento-especial
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