A brasileira surda que vive um conto de fadas
A carioca Brenda Costa, 31 anos, nasceu surda, porém, nunca gostou de se comunicar pela linguagem dos sinais. Aprendeu a falar (coisa rara para quem não ouve), virou expert em leitura labial (em várias línguas!) e ganhou o mundo como modelo – até fotografou com Mario Testino. Mas também sofreu preconceito e foi humilhada por sua condição física.
Há nove anos conheceu seu príncipe, Karim Al-Fayed, surdo como ela e herdeiro de uma das maiores fortunas do planeta. Eles têm uma filhinha perfeita. Sim, é exatamente o que parece: um conto de fadas com final feliz! Aqui, ela conta um pouquinho desta fábula moderna.
” Sou carioca, filha única e surda de nascença – fato que nunca, gosto sempre de frisar, me impediu de realizar tudo o que quis na vida: desde me comunicar no dia a dia até trabalhar, pagar minhas contas, morar fora (em Nova York, Paris e Londres, onde resido hoje), namorar, casar e criar uma filha linda. Sou uma das poucas surdas que conheço que fala. É que o fato de não ouvir dificulta muito o processo de falar. Consigo me fazer entender, ainda que não articule os sons com perfeição, e isso foi fundamental para que eu realizasse tudo o que realizei. O fato de nunca ter estudado em escola especial ajudou bastante. Desde novinha tive de me esforçar muito para entender os amigos na escola, os professores… A vida toda conciliei rotina escolar com sessões de terapia e fonoaudiologia. Também estudei leitura labial e hoje, além do português, entendo francês, italiano e inglês.
Tive muitos golpes de sorte na vida… Um dos maiores, melhores e que mais rendeu frutos foi conhecer num trabalho o amor da minha vida, com quem esotu há nove anos: o Karim (Al-Fayed, egípcio, filho do bilionário Mohamed Al-Fayed e irmão de Dodi, namorado da princesa Diana que morreu com ela no acidente de 1997). Antes dele tive namorados, claro, mas nunca com uma conexão assim! O Karim é fotógrafo e me conheceu numa campanha. Ele ficou louco atrás do meu telefone e, como a agência fez jogo duro, me escalou pra outra campanha, da Harrods, para poder me encontrar. O resto você pode imaginar… me apaixonei – e a recíproca foi verdadeira! Ah, faltou mencionar que o Karim também é deficiente auditivo. Ao contrário de mim, ele não nasceu assim – sua surdez é resultado da meningite que teve quando criança. Claro que essa coincidência terminou nos unindo. Nós dois conhecemos bem a linguagem dos sinais, mas não gostamos de usar. Sabemos e preferimos ler lábios em diferentes idiomas e temos a habilidade de falar – coisa que ele aprendeu também depois de muitas sessões de fono.
O Karim é um homem importante e sinto o maior orgulho disso, embora para mim ele seja “só” pai da nossa Antônia, hoje com 5 anos, e meu marido – um homem encantador, superprotetor, carinhoso e gentil. Se eu puder citar uma parte chata dessa história toda é que, às vezes, preciso bloquear minha agenda como modelo para poder aomcpanhá-lo nos compromissos (Karim atua como fotógrafo, é diretor de fotografia de cinema e, bem, herdeiro de uma das maiores fortunas do planeta). É assim quando se é mulher de alguém tão ocupado, fazer o quê? Isso me machuca um pouco, porque eu amo ser modelo, adoro trabalhar… Mas não se pode ter tudo, né?
Para falar a verdade, sinto que tenho quase tudo. Antônia veio coroar lindamente minha história de superação. Nunca temi que ela tivesse deficiência auditiva. Graças a Deus, minha filha escuta bem e nos entende perfeitamente. Como explicar isso? Parace que desde bebê ela sabe que não escutamos… Quando queria chamar nossa atenção, intuitivamente nos tocava, em vez de emitir sons, como fazem as crianças. Hoje, nos avisa quando a campainha ou o telefone da casa estão tocando. Antônia não conhece a língua dos sinais, mas fala inglês e português e gesticula muito bem. Nossa comunicação – minha, dela e do Karim – se dá por uma linguagem corporal única, que fomos criando naturalmente.
Tento fazer tudo o que posso pela minha filha: dou banho, levo e busco na escola, brinco, faço o dever de casa… Quero ser para ela o que minha mãe foi pra mim. Minha mãe sempre foi minha voz, um pedaço meu. Quando viajo a trabalho, fico doida querendo entrar no Skype pra ver a Antônia, para mostrar o que estou fazendo. Amo quando ela fica imitando minhas poses de modelo!
E o dinheiro?
Hoje, aos 31 anos, não sinto mais dificuldades ou preconceito por ser surda. Superei minhas inseguranças e me acostumei a viver dentro das minhas limitações. Vez ou outra me dizem que é fácil sentir essa aceitação toda porque tenho dinheiro. Bem, de fato o dinheiro é uma ferramenta para deixar a vida mais confortável e me ajudou muito a melhorar a minha comunicação. Afinal, fiz todos os tratamentos possíveis para poder falar e, em 2066, coloquei um implante coclear, uma cirurgia caríssima que proporciona uma leve sensação auditiva – como esquecer o som do vento, a primeira coisa que ouvi? Ou a primeira vez que minha mãe disse o meu nome?
Mas com ou sem dinheiro, uma coisa eu aprendi nesta vida: a gente precisa passar por cima das barreiras e lutar pelo que quer. Pode parecer bobo e óbvio, porém minha história prova que é possível. Mais: que vale a pena. Quero um dia trabalhar em uma ONG brasileira e fazer campanhas para mostrar que os deficientes auditivos podem vencer, ter sucesso em suas profissões, se superarem também no âmbito pessoal. Quero ver alguém dizer não. “
http://diariodosurdo.com.br/2015/06/a-brasileira-surda-que-vive-um-conto-de-fadas/
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