No curta-metragem “O Resto é Silêncio” (2003), dirigido por Paulo Halm, o protagonista é um garoto surdo que gosta de frequentar uma loja de disco só para observar os movimentos e as expressões das pessoas que ouvem música nos fones disponíveis no estabelecimento.
Seu desejo era descobrir as sensações daquelas pessoas. Mas é
possível “sentir” a música sem ouvi-la? O filme instigou o músico e
professor Irton Silva, mais conhecido como Batman Griô, a buscar a
resposta. E foi assim que surgiu, em 2009, no Recife, o projeto Som da
Pele – pioneiro no País na música participativa com pessoas surdas.
“A música não é para ser ouvida. É para ser sentida. Ao aprender a
tocar um instrumento, os surdos têm a oportunidade de descobrir as
sensações que a música proporciona”, explica Batman Griô, que atualmente
desenvolve o projeto com alunos e ex-alunos da Escola Municipal
Severina Lima, no bairro da Tamarineira, no Recife. A iniciativa conta
com o apoio do Serviço Social do Comércio (Sesc). Uma vez por semana,
sempre às quartas-feiras, nove jovens entre 15 e 19 anos, todos com
deficiência auditiva, se reúnem na escola para aprender a tocar os
ritmos da cultura popular, como maracatu, samba, frevo e ciranda.
Para a jovem Maria Eduarda Oliveira Monteiro, 16 anos, tocar um
instrumento de percussão parecia algo impossível. “Achava bonito as
pessoas tocando, mas não imaginava que também poderia aprender. No
início, achei difícil, mas, aos poucos, comecei a gostar e hoje sinto a
música no coração. É uma prova de que todos nós somos capazes”, afirma.
O aluno Rubem Paulo Rosas, 16, guarda na memória o dia em que o grupo
da escola realizou sua primeira apresentação, no início deste ano, em
um shopping da cidade. “Lembro da sensação de felicidade que senti no
palco e, por isso, quero continuar aprendendo. Quando estou tocando
alfaia, consigo sentir a vibração do instrumento”, afirma.
Para ensinar música aos surdos, Batman Griô utiliza a linguagem de
sinais (Libras). Alguns dos sinais foram criados por ele para distinguir
as notações musicais que compõem o ritmo. O professor também
desenvolveu um sistema de luzes chamado de “Metrônomo Visual”. O
equipamento possui um sequenciador eletrônico e uma combinação de
lâmpadas – de várias cores e tamanhos. As lâmpadas acendem no tempo e
sequência determinados pelo professor, representando a estrutura de um
compasso musical.
“Quando a lâmpada branca acende, por exemplo, os alunos sabem que
precisam ‘tocar forte’; a verde já representa o toque contínuo, mais
fraco. E assim vamos introduzindo lâmpadas de outras cores e tamanhos.
Também trabalhamos a pausa musical”, explica Batman. Para cada batida no
tambor ou na alfaia, os alunos precisam observar atentamente o acender e
apagar das luzes. E, como mágica, a música surge dentro da pequena sala
da escola municipal.
BATUQUEIROS DO SILÊNCIO – Desde quando foi criado em
2009, o projeto Som da Pele já promoveu aulas em vários locais do
Recife, entre escolas e instituições. A iniciativa deu tão certo que
alunos mais antigos formaram o Grupo Batuqueiros do Silêncio.
O grupo realiza várias apresentações em Pernambuco e em outros
estados do País. “Muitas pessoas assistem aos shows sem saber que os
músicos são surdos. E ficam impressionados quando descobrem”, afirma
Batman. O sucesso é mais um incentivo para os alunos da Escola Severina
Lima, que, em breve, poderão fazer parte do grupo.
http://www.surdosol.com.br/e-possivel-sentir-a-musica-sem-ouvi-la-surdos-provam-que-sim/
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