http://adedeycastro.com/2013/05/24/universidade-condenada-a-pagar-danos-morais-por-negar-interprete-de-libras-a-surdo/
JUIZADO ESPECIAL CÍVEL
PROCESSO N.º 027/3.13.0001292-1
AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS
AUTORA: DANIELE CUNHA PIRES
RÉU: CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO – UNIFRA
JUIZ LEIGO PROLATOR DO PARECER: PIETRO TOALDO DAL FORNO
DATA: 20 DE MAIO DE 2013
VISTOS ETC.
DANIELE CUNHA PIRES ajuizou a presente ação de cumprimento de obrigação de fazer c/c reparação de danos morais em face do CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO – UNIFRA, ambas as partes já devidamente qualificadas nos autos.
A demandante aduziu ser portadora de
deficiência auditiva, fazendo uso da Linguagem Brasileira de Sinais
(LIBRAS) para a sua comunicação.
Inferiu que ao ser aprovada no Vestibular
do requerido para o Curso de Farmácia, solicitou que lhe fosse
disponibilizado um intérprete de LIBRAS, a fim de que pudesse assistir e
compreender as aulas, porém, não teve o seu pedido atendido.
Juntou documentos.
Pleiteou a condenação do réu a pagar-lhe o
valor a ser arbitrado por este Juízo, porém não inferior a R$6.780,00
(seis mil e setecentos e oitenta reais) a título de danos morais. Em
sede de antecipação dos efeitos da tutela, pugnou pela determinação ao
demandado para disponibilizar-lhe um intérprete de LIBRAS.
Foi determinada à requerente a juntada de documentos, o que foi atendido pela mesma.
Em audiência conciliatória aprazada, em
que foi presidida pela Juíza Presidente deste Juizado, compareceram
ambas as partes. Proposta a conciliação, a mesma resultou inexitosa,
sendo determinada, de comum acordo, a suspensão do feito até o dia
12/04/2013, a fim de possibilitar eventual conciliação.
Aquela resultou inexitosa, sendo
apresentada a contestação com preliminar, em que o postulado trouxe à
baila algumas considerações a fim de afastar os pleitos deduzidos na
inicial.
Juntou documentos.
Pediu o acolhimento da preliminar
suscitada, com a extinção do feito sem resolução do mérito; ou a total
improcedência dos pedidos.
Este Juízo afastou a preliminar
suscitada, deferindo o pedido liminar pugnado na peça vestibular.
Determinou, ainda, a intimação da autora para manifestar-se.
Sobreveio a réplica à contestação.
Encerrada a instrução, vieram os autos conclusos para a prolação do parecer.
É o relatório.
Exaro o parecer.
Trata-se de AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARATÇÃO DE DANOS MORAIS ajuizada por DANIELE CUNHA PIRES em face do CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO – UNIFRA,
em que aquela postula a condenação do réu a pagar-lhe o valor a ser
arbitrado por este Juízo, porém não inferior a R$6.780,00 (seis mil e
setecentos e oitenta reais) a título de danos morais. Em sede de
antecipação dos efeitos da tutela, pugna pela determinação ao demandado
para disponibilizar-lhe um intérprete de LIBRAS.
De pronto, reitero a decisão exarada por este Juízo em 16/04/2013 (fls. 103-104)
no que tange ao afastamento da preliminar suscitada pelo demandado,
acrescentando, ainda, que a autora propôs a presente demanda na Justiça
Federal (Juizado Especial Federal), a qual declinou a sua competência.
Mister trazer, ainda, voto da Relatora do
Agravo de Instrumento n.º 2005.04.01.027135-0 (3ª Turma do Tribunal
Regional Federal da 4ª Região), na ocasião Juíza Federal, Dra. Vânia
Hack de Almeida, em caso análogo, in verbis:
“Quando da apreciação do pedido de antecipação de tutela, assim me manifestei:
“Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão do juiz de primeiro grau que reconheceu ex
officio a incompetência absoluta da Justiça Federal para o julgamento
da ação, determinando a remessa dos autos à e. Justiça do Estado.
Não há porque modificar a decisão
agravada, na medida em que a negativa da instituição de ensino superior
em garantir a presença de intérpretes de LIBRAS, nos cursos em que
estejam matriculados alunos surdos-mudos, constitui ato de gestão e não
ato delegado do Poder Público. Desta feita, justifica-se a competência
da Justiça Estadual para processar e julgar a presente ação.
Tal assertiva encontra amparo na jurisprudência do STJ, nestes termos:
“PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO – CONFLITO DE COMPETÊNCIA – ENSINO SUPERIOR – ATO DE GESTÃO – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1. A negativa de fornecimento de documentos a aluno, pelo diretor de
faculdade particular (em virtude de inadimplemento), para fins de
realização de matrícula em outra instituição de ensino constitui ato
de gestão e não ato delegado do poder público. Competência da
Justiça Estadual.
2. Conflito conhecido, para declarar a competência do juízo
suscitado.
(Processo CC 39401 / PB ; CONFLITO DE
COMPETENCIA 2003/0102894-4 Relator(a) Ministra ELIANA CALMON (1114)
Órgão Julgador S1 – PRIMEIRA SEÇÃO Data do Julgamento 27/08/2003 Data da
Publicação/Fonte DJ 10.11.2003 p. 150).”
Diante do exposto, indefiro a antecipação de tutela postulada.”
Inexistem razões para modificar o entendimento inicial.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento.
É o voto”.
Nessa toada, tenho por bem afastar a
preliminar ora em comento, a fim de determinar o prosseguimento do feito
na Justiça Estadual e, consequentemente, neste Juizado Especial Cível.
Ultrapassadas tais considerações, passo ao exame do meritum causae,
pois, tendo em vista a celeridade processual, um dos princípios
norteadores dos Juizados Especiais, concebo como apto ao julgamento o
presente feito.
A autora, nas suas alegações, alude, em
suma, ser portadora de deficiência auditiva, fazendo necessário o uso da
Linguagem Brasileira de Sinais (LIBRAS) para a sua comunicação (e, por
conseguinte, nas aulas do Curso de Farmácia do réu em que se matriculou
no primeiro semestre do corrente ano).
O requerido, por sua vez, sustenta, em
resumo, que as Instituições de Ensino Privadas não estão obrigadas a
disponibilizar intérpretes para seus alunos portadores de deficiência
auditiva.
Primeiramente, passo à análise do pedido
de cumprimento de obrigação de fazer deduzido na inicial, adiantando,
desde já, que o caso posto a desate merece profundas reflexões.
O caso sub judice trata-se, na
verdade, de nítida discriminação, haja vista que o exercício do direito à
educação da autora está sendo dificultado pelo réu devido à deficiência
que aquela porta e a recusa do demandado de razoavelmente adaptar-se a
mesma.
Os dispositivos previstos na Carta Magna
(art. 3º, inc. IV; art. 7º; inc. XXXI; art. 23, inc. II; art. 24, inc.
XIV; art. 37, inc. VIII; art. 203, inc. IV; art. 208, inc. III e art.
227, § 1º, inc. II) e as normas inseridas pelos tratados internacionais
de direitos humanos (Convenção Internacional sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e a Convenção Interamericana para a Eliminação
de todas as formas de discriminação contra Pessoas Portadoras de
Deficiência, ambas formalmente introduzidas no Brasil) são explícitos no
que tange à censura diante da discriminação por motivo de deficiência.
Como já foi aludido por este Juízo quando
do deferimento do pedido de antecipação dos efeitos da tutela, a
educação, por sua natureza e relevância, não se constitui em mero
serviço disponibilizado mediante contraprestação pecuniária.
Trata-se, na verdade, de atividade
revestida de caráter social, decorrente da exploração de serviço
público, devendo a instituição de ensino privada exercente arcar com
eventuais ônus decorrentes de tal situação, se o caso concreto assim
desejar.
A Magna Carta assegura, com propriedade, o
direito à igualdade e à cidadania, vedando qualquer espécie de
discriminação, elencando como princípio fundamental do Estado
Democrático de Direito a Dignidade da Pessoa Humana.
Neste contexto, traz-se à baila trecho
da sentença proferida pelo Juiz Federal Roger Raupp Rios, o qual, na
época (10/09/2009), atuava na 4ª Vara Federal da Circunscrição
Judiciária de Porto Alegre, quando do julgamento da Ação Civil Pública
n.º 2005.71.00.017955-5/RS proposta pelo Ministério Público Federal em
face da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, in verbis:
“(…)
A negativa da instituição
universitária compromete o exercício do direito à educação, na medida em
que cria obstáculo gravíssimo para a participação e a inserção de
pessoas portadoras de deficiência nas atividades universitárias. De modo
mais específico, descuida das normas constitucionais relativas ao
direito à educação, tanto na sua dimensão prestacional, quanto na sua
dimensão de defesa.
O artigo 205 estatui que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade. Não
há dúvida de que a universidade demandada, como integrante do sistema
privado de ensino superior, tem o dever de promover e incentivar o
direito à educação.
O artigo 206, que estabelece os princípios orientadores do ensino, aplicável sem dúvida à universidade demandada, prevê a igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola (inc. I) e a liberdade de aprender e divulgar o pensamento, a arte o saber,
âmbitos da vida acadêmica seriamente desafiados pela omissão na oferta
de intérpretes de LIBRAS, em notório detrimento das pessoas portadoras
de deficiência.
Estas normas se dirigem, sem sombra de dúvida, às universidades privadas, sob pena de tornar letra morta o inciso I do artigo 209 da Constituição, que só considera legítima a atividade de ensino à iniciativa privada mediante o cumprimento das normas gerais da educação nacional.
Com efeito, não
se pode imaginar que os princípios orientadores do ensino, dispostos no
artigo 206, não sejam normas gerais da educação nacional;
mais que isso, trata-se de normas gerais que veiculam conteúdos de
direitos fundamentais e de direitos humanos, de relevância inconteste
quando se verifica a discriminação experimentada por pessoas portadoras
de deficiência.
No caso da discriminação por motivo de deficiência, há previsão expressa da eficácia entre privados, como dispõe o artigo III, item 1, alínea “a”, da Convenção Interamericana para a Eliminação de todas as formas de discriminação contra Pessoas Portadoras de Deficiência:
1. Tomar as medidas de caráter legislativo, social, educacional, trabalhista, ou de qualquer outra natureza, que sejam necessárias
para eliminar a discriminação contra as pessoas portadoras de
deficiência e proporcionar a sua plena integração à sociedade, entre as quais as medidas abaixo enumeradas, que não devem ser consideradas exclusivas:
a) medidas das autoridades governamentais e/ou
entidades privadas para eliminar progressivamente a discriminação e
promover a integração na prestação ou fornecimento de bens, serviços,
instalações, programas e atividades, tais como o emprego, o transporte, as comunicações, a habitação, o lazer, a educação, o esporte, o acesso à justiça e aos serviços policiais e as atividades políticas e de administração;
O dever jurídico de a universidade
prover seus estudantes portadores de deficiência do auxílio de
intérprete de LIBRAS decorre, portanto, da eficácia de diversas
normas de direitos fundamentais (direito de não-ser discriminado por
motivo de deficiência na permanência na escola; direito à educação;
direito de liberdade de aprender e de divulgar o pensamento, a arte e o
saber), que se dá de modo direto e imediato (art. 5º, p. 1º).
Contra esta conclusão não se argumente
com a ausência de desenvolvimento legislativo do direito à educação
concretizado como proibição de discriminação por motivo de deficiência
ou da inexistência de dispositivo normativo expresso quanto ao dever de
fornecer intérprete de LIBRAS. Isto porque, como está explícito nas
Convenções Internacionais incorporadas no direito brasileiro, a recusa
de adaptação razoável configura violação da norma do direito de
igualdade proibitiva da discriminação por motivo de deficiência.
(…)”. (grifo no original)
Nessa senda, a recusa da ré em
proceder uma adaptação razoável para atender a situação em tela
configura claramente não só uma violação às normas constitucionais, mas
também às Convenções Internacionais (direito de igualdade proibitiva da
discriminação por motivo de deficiência) incorporadas no direito
brasileiro.
Ora, o dever de inclusão (tratamento
prioritário e adequado aos portadores de deficiências, sejam elas
auditivas, físicas ou mentais), o qual tanto se busca no Brasil (e
mundialmente), é de responsabilidade não somente do Estado, mas também
de toda a coletividade (inserindo-se, aqui, por conseguinte, as
Instituições de Ensino Privadas, as quais têm o dever de adaptação
razoável).
Tal adaptação exige, nos termos (art. 2º) da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência,
“a modificação necessária e
adequada e os ajustes que não acarretem um ônus desproporcional ou
indevido, quando necessários em cada caso, a fim de assegurar que as
pessoas com deficiência possam desfrutar ou exercitar, em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e
liberdades fundamentais“.
Evidentemente a oferta de intérpretes
de LIBRAS insere-se, no caso em testilha, como dever de adaptação, o
qual não acarreta ônus desproporcional ou indevido (conforme se
vislumbra dos orçamentos carreados aos autos pela própria ré a pedido
deste Juízo – fls. 98-101), nitidamente necessário para assegurar
o exercício, em igualdade de oportunidades, com as demais pessoas, do
direito à educação.
Destaca-se, ainda, o disposto no art. 24, da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência:
“Educação
1. Os Estados Partes reconhecem o
direito das pessoas com deficiência à educação. Para efetivar esse
direito sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, os
Estados Partes assegurarão sistema educacional inclusivo em todos os
níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida, com os seguintes
objetivos:
a. O pleno desenvolvimento do
potencial humano e do senso de dignidade e auto-estima, além do
fortalecimento do respeito pelos direitos humanos, pelas liberdades
fundamentais e pela diversidade humana;
b. O máximo desenvolvimento possível
da personalidade, dos talentos e da criatividade das pessoas com
deficiência, assim como de suas habilidades físicas e intelectuais;
c. A participação efetiva das pessoas com deficiência em uma sociedade livre.
2. Para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que:
a. As pessoas com deficiência não
sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência
e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino
primário gratuito e compulsório ou do ensino secundário, sob alegação de
deficiência;
b. As pessoas com deficiência possam
ter acesso ao ensino primário inclusivo, de qualidade e gratuito, e ao
ensino secundário, em igualdade de condições com as demais pessoas na
comunidade em que vivem;
c. Adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais sejam providenciadas;
d. As
pessoas com deficiência recebam o apoio necessário, no âmbito do
sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação;
e. Medidas de apoio individualizadas e
efetivas sejam adotadas em ambientes que maximizem o desenvolvimento
acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena”.
Não se pode perder de vista, ainda,
que a legislação brasileira infraconstitucional relativa aos portadores
de deficiência reafirma as diretrizes supracitadas.
A Lei 7.853/89 estabelece como obrigação
do Poder Público e da sociedade a garantia dos direitos das pessoas com
deficiência em seu art. 1º, § 2º:
“Ficam estabelecidas normas gerais
que asseguram o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das
pessoas portadoras de deficiências, e sua efetiva integração social, nos
termos desta Lei.
(…)
§ 2º – As normas desta Lei visam
garantir às pessoas portadoras de deficiência as ações governamentais
necessárias ao seu cumprimento e das demais disposições constitucionais e
legais que lhes concernem, afastadas as discriminações e os
preconceitos de qualquer espécie, e entendida a matéria como obrigação
nacional a cargo do Poder Público e da sociedade”. (grifei)
O Plano Nacional de Educação
(aprovado pela Lei 10.172/01), estabelece a implementação, em cinco
anos, e a generalização, em dez anos, do ensino da Língua Brasileira de
Sinais para os alunos surdos e, sempre que possível, para seus
familiares e para o pessoal da unidade escolar, mediante um programa de
formação de monitores, em parceria com organizações não-governamentais.
Ora, sendo o demandado um dos mais
destacados centros universitários privados gaúcho – e também a nível
federal, com objetivos filantrópicos e humanitários tão elevados e com
grande tradição pedagógica, de há muito ultrapassados os cinco primeiros
anos e já atingidos os dez anos, não há justificativa para a restrição
ora discutida, que tão gravemente compromete o exercício do direito
básico da autora.
Por fim, o Decreto 5.626/05, o qual
determina que as instituições privadas de ensino implementem medidas
como meio de assegurar atendimento educacional especializado aos alunos
surdos ou com deficiência auditiva.
Os Tribunais pátrios não destoam deste entendimento:
EMENTA: ADMINISTRATIVO. MANDADO
DE SEGURANÇA VISANDO À CONTRATAÇÃO E À DISPONIBILIZAÇÃO DE INTÉRPRETE
NA LINGUAGEM DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS-LIBRAS. CONCESSÃO DO AMPARO
MANDAMENTAL. Além de reconhecer a obrigação imposta pela Lei 10.098/00 e
pelo Decreto 5.626/05, a universidade impetrada deve disponibilizar ao
impetrante intérprete da LIBRAS, de modo a afastar prejuízo ao seu
desempenho estudantil. (TRF4, APELREEX 2008.70.00.017365-5, Quarta Turma, Relator Valdemar Capeletti, D.E. 24/08/2009) (grifei)
Ressalta-se, por oportuno, no
presente caso, o fato do demandado ser uma instituição confessional, que
traz como valor implícito uma efetiva inclusão social, através de uma
sociedade mais fraternal, na qual o amor ao próximo, com todas as suas
diferenças, seja sempre constante. Ou seja, o valor cristão cultuado
pelo próprio réu exige necessariamente uma aproximação maior com os
necessitados e não o seu afastamento do corpo discente.
Não é por outro motivo que se vislumbra
no próprio sítio eletrônico do demando a informação da finalidade “de
formar profissionais orientados por princípios éticos e valores
cristãos”, dentre outras.
Não se pode descurar, assim, o próprio
nome do réu, no qual se releva o nome de São Francisco de Assis, cuja
história de vida, – inclusive ensinada pelo réu como disciplina
obrigatória, a fim de imbuir os alunos dos valores franciscanos -, foi
construída através da abdicação de toda a riqueza de sua família e, a
partir daí, numa ajuda incessante aos pobres, leprosos e excluídos.
Portanto, há uma total similitude entre o postulado na presente ação
judicial e os valores ensinados pelo próprio demandado, visto que se
busca um amparo e uma compreensão do réu para se evitar uma exclusão
social em razão de uma deficiência orgânica.
Neste contexto, é importante lembrar o
fundamental papel da educação para que o ser humano possa atingir o seu
ápice, sobretudo numa sociedade cada vez mais informacional, sendo de
toda valia transcrever uma passagem de São Francisco de Assis: “Todos os
seres são iguais, pela sua origem, seus direitos naturais e divinos e
seu objetivo final”.
Nessa toada, afasto todas as alegações
constantes na defesa apresentada pelo postulado, acolhendo, por
conseguinte, o pedido de cumprimento de obrigação de fazer deduzido na
peça vestibular, confirmando a decisão que antecipou os efeitos da
tutela.
No que tange ao pleito indenizatório (o
qual sequer foi contestado pelo réu), flagrante no caso em testilha a
discriminação praticada pelo requerido em função da deficiência que a
requerente porta, determinando a esta à contratação de um intérprete de
LIBRAS, isentando a aluna com o pagamento da mensalidade (quando se sabe
que esta é de valor inferior aos custos de um profissional intérprete).
Tal situação impossibilitou a autora de iniciar o tão sonhado Curso Superior no primeiro semestre do corrente ano.
Cumpre mencionar que a indenização por
dano moral tem função dúplice. De um lado, compensar a vítima. Do outro,
punir o agressor. É a chamada função punitiva ou pedagógica do dano
moral (exemplary or punitive damages).
Embora não haja, no Brasil, lei que
expressamente autorize tal função punitiva, ela é largamente aceita pela
jurisprudência. Constata-se que em inúmeros julgados, a alusão à função
inibidora que a indenização deve ter, em ordem a evitar condutas
semelhantes a dos autos.
A indenização punitiva pode fixar uma punição exemplar, como forma de
“contribuir para desestimular o
ofensor a repetir o ato, inibindo sua conduta antijurídica” (STJ, REsp.
550.317, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª T., j. 01/06/99, p. DJ 13/06/05).
O caso em tela não se está diante de
mero dissabor da vida moderna ou de simples percalços a que estão
sujeitos todas as pessoas inseridas em uma sociedade, tendo em vista que
os incômodos sofridos pela requerente ultrapassaram os limites daqueles
que podem – e devem – ser absorvidos pelo homo medius (além de ser discriminada, viu-se impossibilitada de iniciar o seu Curso Superior no primeiro semestre de 2013).
Configurado o dever de indenizar, resta fixar o quantum indenizatório,
tarefa difícil que requer muito do arbitramento do juiz, de modo que a
indenização não constitua fonte de enriquecimento ilícito para o
ofendido, transformando ofensor em vítima da excessiva majoração. Da
mesma forma que não pode representar um valor irrisório ao causador do
dano.
Importante mencionar que o arbitramento
do montante da indenização deve levar em consideração tanto a finalidade
de ressarcimento do agredido, quanto a finalidade de punição ao
ofensor, a fim de inibi-lo a voltar a praticar a conduta ilícita.
Sendo assim, levando em consideração
estes critérios, fixo a indenização pelos danos morais no valor de
R$5.000,00 (cinco mil reais).
ISTO POSTO, OPINO pela PARCIAL
PROCEDÊNCIA da pretensão deduzida por DANIELE CUNHA PIRES em face do
CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO – UNIFRA, a fim de tornar definitiva a
decisão que antecipou os efeitos da tutela (fls. 103-104).
Outrossim, OPINO pela condenação do réu a
pagar à autora a quantia de R$5.000,00 (cinco mil reais) a título de
danos morais, acrescida de correção monetária pelo IGP-M desde a
homologação do presente parecer, bem como de juros legais, estes a
contar da citação.
A parte ré fica intimada de que a) se
não interpuser recurso, terá o prazo de 15 dias, a contar do trânsito em
julgado da sentença, para cumprir a obrigação espontaneamente, sob pena
de, decorrido tal prazo, incidir multa de 10% sobre o valor da
condenação, nos termos do art. 475-J do CPC e b) se interpuser recurso,
desde já fica intimada do prazo de 15 dias, a contar da ciência do
retorno dos autos da Superior Instância, cuja intimação se dará através
de nota de expediente, para cumprir a obrigação espontaneamente, sob
pena de, decorrido tal prazo, incidir multa de 10% sobre o valor da
condenação, nos termos do art. 475-J do CPC, redação dada pela Lei
11.232/2005 e, ainda em consonância com o verbete nº 21 da súmula das
Turmas Recursais Cíveis.
Sem condenação nos ônus sucumbenciais,
inclusive honorários de advogado, posto que incabíveis neste grau de
jurisdição, forte no artigo 55, da Lei 9.099/95.
À consideração da MM. Juíza Presidente do
Juizado Especial Cível desta Comarca para apreciação do presente
parecer, de acordo com o art. 40, da Lei 9.099/95.
Parecer lavrado em quinze laudas, as quatorze primeiras rubricadas e esta última assinada.
Santa Maria, 20 de maio de 2013.
PIETRO TOALDO DAL FORNO
Juiz Leigo
Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul Número do Processo: 31300012921 Comarca: Santa Maria Órgão Julgador: Vara do JEC : 1 / 1 |
Julgador: |
Karla Aveline de Oliveira |
Despacho: |
Vistos. 1. Homologo, por sentença, o parecer retro. 2. Em homenagem aos princípios da instrumentalidade, celeridade e economia processual, eventuais recursos inominados interpostos estão automaticamente recebidos no efeito devolutivo (art. 43 da Lei nº 9.099/95). 2.1. O Cartório deverá diligenciar os demais atos (contrarrazões, preparo, etc) até remessa dos autos às Turmas Recursais Cíveis. Ressalvam-se, entretanto, as hipóteses de intempestividade, ausência de preparo (a menos que o recorrente litigue amparado pelo benefício da gratuidade judiciária) e oposição de embargos de declaração, quando os autos deverão vir conclusos. Se houver pedido de AJG, o cartório deverá cumprir a ordem de serviço nº 01/2012. 3. Decorrido o prazo recursal sem interposição de recurso inominado, certifique-se o trânsito em julgado e aguarde-se cumprimento voluntário. Não havendo, intime-se a parte credora para que diga sobre o interesse no prosseguimento, requerendo o que de direito entender e instruindo o pedido com a documentação pertinente, em 05 dias, ciente que no silêncio o feito será arquivado. 4. Interposto recurso, com o retorno dos autos da Superior Instância, mantida a condenação, intimem-se partes do retorno dos autos e intime-se devedor para cumprimento voluntário, consoante determinação contida no dispositivo da sentença ou do acórdão. Após: 4.1. Decorrido o prazo sem manifestação, cumpra-se, no que couber, determinação constante no item ¿3¿, parte final. 4.2. Havendo pagamento, expeça-se alvará para levantamento dos valores depositados judicialmente a título de condenação, intimando a parte credora para que diga sobre a satisfação do crédito e/ou interesse no prosseguimento do processo ¿ caso em que deverá juntar demonstrativo do montante devido, deduzindo o pagamento já realizado. Nada sendo requerido, em cinco dias, ao arquivo. 5. Por outro lado, se a sentença foi reformada e houve a rejeição do pedido inicial, havendo custas não pagas, cumpra-se o Ato 010/2011-P e arquive-se.http://adedeycastro.com/2013/05/24/universidade-condenada-a-pagar-danos-morais-por-negar-interprete-de-libras-a-surdo/ |
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