4/1/2013 às 13h01 (Atualizado em 4/1/2013 às 13h01)
Policiais surdos trabalham onde ver conta mais que ouvir
230 câmeras de segurança em Oaxaca, no México, são monitoradas por 20 oficiais surdos
Quando o policial observou um homem agindo suspeitosamente, caminhando
de modo errático e com um olhar estranho, ele imediatamente chamou
reforços. Isto é, ele girou sua cadeira aqui no centro de comando da
polícia e rapidamente sinalizou para o colega em linguagem de sinais.
O policial Gerardo, de 32 anos, faz parte de um quadro de 20 policiais
surdos que se formaram há alguns meses para ajudar a vigiar este centro
turístico. O homem suspeito que ele avistou na câmera de segurança
acabou sendo o suspeito principal de um caso de assassinato.
"Embora não possamos escutar, podemos nos encarregar de qualquer trabalho", Gerardo disse, falando através de um intérprete.
Mais de 200 câmeras observam a cidade, uma das muitas no México que
instalaram tais sistemas de segurança nos últimos anos a fim de combater
a criminalidade nas ruas. Mesmo tendo levantado algumas preocupações
com a privacidade, os policiais comemoraram a instalação dos sistemas,
que darão a eles uma ferramenta a mais para diminuir o tempo de resposta
e documentar crimes.
Os oficiais daqui reconhecem que chegar rapidamente com as unidades ao
local do crime é apenas uma parte do problema. As vítimas dos crimes
frequentemente decidem não prestar queixa, por falta de fé no sistema
judiciário.
Os turistas desta cidade colonial, famosa pela arte e pela comida,
parecem tranquilos com as câmeras de segurança e com o fato de passearem
ao lado de avisos de que a área está sendo vigiada. Embora Oaxaca não
seja conhecida por uma alta taxa de criminalidade, os turistas podem
ser alvos fáceis para trombadinhas, e os bairros mais de classe operária
têm sua cota de tráfico de drogas, ladrões de carros, brigas e crimes
violentos.
O Estado reformulou o centro de comando em 2012, mas achou que ele
precisava de uma ajuda extra para monitorar as 230 câmeras, uma tarefa
demorada e monótona. Havia outro problema: já que as imagens não tinham
som, os oficiais tinham problemas em determinar o que as pessoas estavam
falando.
"Nós não sabíamos fazer leitura labial, então nos ocorreu usar pessoas
surdas, já que muitos deles sabem", disse Ignacio Villalobos, o
subsecretário de segurança pública daqui.
Ele disse que a atenção visual intensificada permitiu que os oficiais
surdos vissem os problemas acontecendo na tela mais rapidamente do que
outros policiais que podem ouvir e falar, mas que estão frequentemente
distraídos pelos toques dos telefones, scanners policiais e conversas no
centro de operações.
Villalobos disse que os oficiais surdos — "nossos anjos silenciosos",
como ele os chama — já ajudaram a resolver ou deram assistência em
vários casos, embora ele tenha se recusado a prover dados específicos,
até uma futura avaliação do programa. Ele chamou o caso de assassinato
de "o maior sucesso".
Os oficiais receberam treinamento dos procedimentos policiais, mas não
são policiais de patrulha juramentados e não carregam armas. Seu
trabalho está limitado ao centro de comando, mas os supervisores não
quiseram seus sobrenomes publicados, devido ao envolvimento deles nos
relatos de crimes.
Poucos deles tinham trabalhos lucrativos antes de virarem combatentes
do crime. Os deficientes no México têm altas taxas de desemprego e,
frequentemente, são ajudados pela família e pelos amigos.
Mas o setor privado e algumas fundações estão trabalhando para reverter
isso. Entre os programas de maior visibilidade está um no aeroporto
internacional na Cidade do México, onde cadeirantes trabalham checando
os documentos de identificação nas filas de segurança e respondendo
dúvidas de turistas.
Uma manhã recente mostrou a monotonia que geralmente caracteriza o
trabalho da polícia, conforme vários oficiais surdos fixavam seus olhos
nas telas que mostravam a natureza rotineira da vida na cidade.
"Parece uma guerra lá", disse um oficial entusiasmado, conforme os
expedidores apanhavam seus rádios e mandavam unidades. Mas os oficiais
rapidamente determinaram que era apenas um bando de crianças fazendo
baderna.
Outro policial viu um casal abrindo o que pareciam ser cervejas em seu
carro, estacionado no acostamento de uma estrada. Uma unidade de
patrulha foi enviada, mas o casal foi liberado para ir embora com uma
advertência, depois de esvaziarem as garrafas. No início, os oficiais
veteranos riam das reações embasbacadas dos novatos diante de acidentes
de carro e roubos de bolsa rotineiros mas, com o tempo, os novatos estão
desenvolvendo uma carcaça mais dura.
"Nós os desumanizamos um pouco, e eles nos humanizaram", disse Villalobos com uma gargalhada.
Os oficiais, a maioria recrutada de organizações de serviços sociais,
disseram que depois da batalha para conseguir um emprego, o trabalho na
polícia era recompensador.
Uma policial novata, Eunice, de 26 anos, disse que havia sido rejeitada
em outros empregos de escritório e lojas, com poucos gerentes dispostos
a lhe dar uma chance ou ajustar os cargos de acordo com sua surdez.
Mas ela achou seu nicho como policial. Recentemente em uma noite, disse
ela, a imagem de alguém sendo atropelado por um carro piscou em sua
tela, a princípio deixando-a chocada. Mas ela rapidamente se compôs e
alertou o expedidor.
Com um sorriso cheio de orgulho, ela simplesmente disse: "nós somos os olhos deles".
http://noticias.r7.com/internacional/policiais-surdos-trabalham-onde-ver-conta-mais-que-ouvir-04012013
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