Surdez em Idosos e o Risco de Demência
Minha paciente GTM acaba de fazer
97anos. Há 5 anos diagnosticamos a sua perda auditiva e frente a minha
indicação de aparelhos auditivos, ela não questionou. Faz uso deles o
dia inteiro, todos os dias, desde então. Sua preocupação maior é a troca
de pilhas e o bom funcionamento dos aparelhos. Nunca se referiu a eles
como sendo algo negativo. Eles a fazem escutar melhor e ela agradece.
Mas nem sempre é assim…
É bem sabido que a incidência de perda
auditiva aumenta bastante com a idade. Cerca de um terço dos pacientes
acima de 65 anos têm algum grau de perda auditiva. A partir dos 75, pelo
menos metade das pessoas sofre com a surdez.
Conhecida também da maioria das famílias
é a figura do(a) pai/mãe ou avô/avó que não ouve bem, não aceita que
não escuta e acha que “está bem assim”, “que as pessoas falam pra
dentro” ou que “prefere não escutar”. A surdez na terceira idade é algo
de difícil reconhecimento e aceitação para grande parte dos pacientes.
Outro dado bastante propagado se refere
ao envelhecimento da população brasileira, decorrente do notável aumento
da expectativa de vida média dos brasileiros nas últimas décadas, como
vemos no quadro abaixo, baseado em dados do Banco Mundial. Isso resultou
num grande aumento de casos de surdez em idosos sem a devida adequação
na estrutura e no número de profissionais dedicados à reabilitação
auditiva, seja no SUS ou na medicina privada.
Entretanto, as maiores novidades no que se refere à surdez em idosos vêm
da ciência. É crescente o numero de estudos que relacionam a presença
de perda auditiva a um maior risco de problemas cognitivos, maior
atrofia cerebral (Ref. 1) e risco aumentado de demência (Ref. 2) ou
depressão. Segundo tais estudos, além da tendência ao maior isolamento,
que prejudica o contato familiar e social, a diminuição dos estímulos
cerebrais causados pela surdez seria mais um “golpe” no cérebro desses
pacientes. A diminuição dos estímulos auditivos afetaria enormemente não
só as áreas responsáveis pelo processamento sonoro e de linguagem – os
giros superior, médio e inferior do lobo temporal (esses dois últimos
também implicados no aparecimento do mal de Alzheimer) – mas o cérebro
como um todo. A privação sonora poderia acelerar a perda de massa
encefálica em mais de um centímetro cúbico por ano, em comparação com os
idosos com audição normal.
Para nós, médicos e fonoaudiólogos
envolvidos na reabilitação auditiva, esses dados são importantes demais.
Não podemos mais considerar apenas “uma opção” o uso de aparelhos
auditivos ou implantes cocleares em pacientes idosos com perda de
audição. Para familiares e amigos de pacientes nessa situação, a postura
deve ser de colaboração, informação e estímulo para que procurem ajuda
especializada. Mais do que faze-los ouvir mais e melhor, tal cenário nos
coloca diante da chance de praticar a melhor medicina: a preventiva.
Tudo indica que tratar a surdez em idosos – com aparelhos auditivos,
implantes cocleares e as terapias fonoaudiológicas adaptadas a cada caso
– pode ajudar a manter o cérebro em dia por muito mais tempo.
Luciano Moreira – Otorrinolaringologista
http://portalotorrino.com.br/surdez-em-idosos-e-o-risco-de-demencia/
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