Um pouco de história... LIBRAS
Língua de sinais
“Podemos
afirmar, que as Línguas de Sinais existiram desde que existe a língua oral
humana, e sempre que existirem surdos reunidos por mais de duas gerações em
comunidades (Sacks, 1990:62).”
Pelo fato de as Línguas de
Sinais serem “faladas”, sem registro escrito, existe muita dificuldade de
localizar as origens das mesmas. Por se tratarem também de comunidades pequenas
e não reunidas geograficamente, o que se conhece até hoje sobre os surdos e
suas Línguas de Sinais ainda é pouco.
O primeiro livro conhecido
em inglês que descreve a Língua de Sinais como um sistema complexo, na qual
"homens que nascem surdos e mudos (...) podem argumentar e discutir retoricamente
através de sinais” data de 1644, com autoria de J. Bulwer, Chirologia.
Em 1648, do livro
Philocophus, do mesmo autor, dedicado a dois surdos: o baronês Sir Edward Gostwick
e seu irmão William Gostwick, no qual se afirma que o surdo pode expressar-se
verdadeiramente por sinais se ele souber essa língua tanto quanto um ouvinte
domine sua língua oral (in Woll,1987:12).
Quase dois séculos depois,
em 1809, Watson (que era neto de Thomas Braidwood, fundador da primeira escola
para surdos na Inglaterra) descreve em seu livro Instruction of the deaf and
dumb um método combinado de sinais e desenvolvimento da fala.
Em 1760, na França, o
abade l'Epée (Charles Michel de l'Epée: 1712 -1789) iniciou o trabalho de
instrução formal com duas surdas a partir da Língua de Sinais que se falava
pelas ruas de Paris, datilologia/alfabeto manual e sinais criados e obteve
grande êxito, sendo que a partir dessa época a metodologia por ele desenvolvida
tornou-se conhecida e respeitada, assumida pelo então Instituto de Surdos e
Mudos (atual Instituto Nacional de Jovens Surdos), em Paris, como o caminho correto
para a educação dos seus alunos.
Thomas Hopkins
Gallaudet, professor americano de surdos, visitou a instituição em 1815 com o
objetivo de conhecer o trabalho lá realizado (antes ele passara pela Inglaterra
tentando aprender com os Braidwod acerca da metodologia oralista que eles
desenvolviam, não obtendo aceitação, pois os profissionais negaram-se a ensinar
em poucos meses o que sabiam). De tão impressionado que ficou, Gallaudet
convidou um dos melhores alunos da escola, Laurence Clerc, a acompanhá-lo de
volta aos Estados Unidos.
Lá, em 1817, os dois
fundaram a primeira escola permanente para surdos em Hartford, Connecticut. Ao
lado de escolas que continuaram a desenvolver o método oralista, em 1821 todas
as escolas públicas americanas passaram a se mover em direção à ASL (Língua de
Sinais Americana) como sua língua de instrução, o que levou em 1835 à uma total
aceitação da ASL na educação de surdos nos Estados Unidos. Ramos (1992:65)
relata que houve em conseqüência dessa atitude uma elevação do grau de
escolarização das crianças surdas, que passaram a atingir o mercado
profissional de nível mais alto, a maioria delas optando por se tornarem
professores de surdos.
Em 1965 é publicado nos
Estados Unidos o primeiro dicionário de língua de sinais por William C. Stokoe
em co-autoria com D. Casterline e C. Cronoberg. Os Estados Unidos continuam até
hoje sendo o centro mundial mais importante de pesquisa lingüística em Língua
de Sinais, contando atualmente, inclusive, com alguns pesquisadores surdos em
suas equipes, inaugurando um momento de trabalhos que trazem forte influência
da visão culturalista.
Libras no Brasil
É conhecido
como o "início oficial" da educação dos surdos brasileiros a
fundação, no Rio de Janeiro, do Instituto Nacional de Surdos-Mudos (INSM, atual
Instituto Nacional de Educação de Surdos- INES), através da Lei 839, que D. Pedro
II assinou em 26 de setembro de 1857. Porém, já em 1835, um deputado de nome
Cornélio
Ferreira
apresentara à Assembléia um projeto de lei que criava o cargo de
"professor de primeiras letras para o ensino de cegos e surdo-mudos" (Reis,1992:57).
Projeto esse que não conseguiu ser aprovado.
Reis relata que o professor Geraldo Cavalcanti de Albuquerque, discípulo
do professor João Brasil Silvado (diretor do INSM em 1907), informou-lhe em
entrevista que o interesse do imperador D. Pedro II em educação de surdos viria
do fato de ser a princesa Isabel mãe de um filho surdo e casada com o Conde
D’Eu, parcialmente surdo. Sabe-se que, realmente, houve empenho especial por
parte de D. Pedro II quanto à fundação de uma escola para surdos, mandando
inclusive trazer para o país em 1855 um professor surdo francês, Ernest (ou
Eduard) Huet, vindo do Instituto de Surdos-Mudos de Paris, para que o trabalho
com os surdos estivesse atualizado com as novas metodologias educacionais.
Tobias Leite (1877) e Compêndio para o ensino dos surdos-mudos (1881),
nos quais se percebe que havia aceitação da Língua de Sinais e do alfabeto
datilológico. O autor considerava a utilidade dos dois no ensino do surdo, como
forma de facilitar o entendimento professor/aluno. (Leite,1881 in Reis, 1992:60/68)
É de 1873 a
publicação do mais importante documento encontrado até hoje sobre a Língua
Brasileira de Sinais, o Iconographia dos Signaes dos Surdos-Mudos, de autoria
do aluno surdo Flausino José da Gama, com ilustrações de sinais separados por
categorias (animais, objetos, etc).
Como é explicado no prefácio do livro, a inspiração para o trabalho veio
de um livro publicado na França e que se encontrava à disposição dos alunos na
Biblioteca do INSM. Vale ressaltar que Flausino foi autor das ilustrações e da
própria impressão em técnica de litografia. Não sabemos se o organização também
foi realizada por ele.
Somente em 1957, por iniciativa da diretora Ana Rímoli de Faria Doria e
por influência da pedagoga Alpia Couto, finalmente a Língua de Sinais foi
oficialmente proibida em sala de aula. Medidas como o impedimento do contato de
alunos mais velhos com os novatos foram tomadas, mas nunca o êxito foi pleno e
a LIBRAS sobreviveu durante esses anos dentro do atual INES.
Em depoimento informal, uma professora que atuou naquela época de
proibições (que durou, aliás, até a década de 1980) contou-nos que os sinais
nunca desapareceram da escola, sendo feitos por debaixo da própria roupa das
crianças ou embaixo das carteiras escolares ou ainda em espaços em que não
havia fiscalização. É evidente, porém, que um tipo de proibição desses gera prejuízos
irrecuperáveis para uma língua e para uma cultura.
Em 1969, foi feita uma primeira tentativa no sentido de tentar registrar
a Língua de Sinais falada no Brasil. Eugênio Oates, um missionário americano,
publica um pequeno dicionário de sinais, Linguagem das mãos, que segundo
Ferreira Brito (1993), apresenta um índice de aceitação por parte dos surdos de
50% dos sinais listados.
A partir de 1970, quando a filosofia da Comunicação Total e, em seguida,
do Bilingüismo, firmaram raízes na educação dos surdos brasileiros, atividades
e pesquisas relativas à LIBRAS têm aumentado enormemente.
Em 2001 foi lançado em
São Paulo o Dicionário Enciclopédico Ilustrado de LIBRAS, em um projeto
coordenado pelo Professor Doutor (Instituto de Psicologia/USP) Fernando
Capovilla e em março de 2002 o Dicionário LIBRAS/Português em CD-ROM, trabalho
realizado pelo INES/MEC e coordenado pela Professora Doutora Tanya Mara
Felipe/UFPernambuco/FENEIS.
Nacionalmente, a LIBRAS foi, recentemente, oficializada através da Lei
n.º 4.857 / 2002, enquanto língua dos surdos brasileiros, o que, aliada à
aceitação da LIBRAS pelo MEC, irá tornar a educação dos surdos e a vida dos
surdos cada vez mais fácil.
Curiosidades
1.
Quem propôs em 1994 a abreviação “LIBRAS” para a língua de
sinais no Brasil foi a pesquisadora e professora Lucinda Ferreira Brito (1993).
2. A comunicação total
possui como principal preocupação os processos comunicativos entre surdos e surdos
e entre surdos e ouvintes, considerando que os aspectos cognitivos, emocionais
e sociais não devem ser deixados de lado em prol do aprendizado exclusivo da
língua oral. Tal corrente utiliza basicamente recursos espaço-visuais como
facilitadores de aprendizagem.
3.
O bilinguismo prega a
aceitação e a convivência com a diferença, procurando aproximar e facilitar a
comunicação entre a criança surda e a família ouvinte. O pressuposto básico
desta filosofia é o aprendizado da língua materna e natural (de sinais) e como
segunda língua a oficial do país (para nós, o português brasileiro)
Referências
FERREIRA BRITO, Lucinda. Integração social & educação de
surdos. R.J.: Babel, 1993. Por uma gramática de Língua de Sinais. R.J.:
Tempo Brasileiro, 1995.
KRISTEVA, Julia. Le langage, cet inconnu. Une initiation à
la lingüistique. Paris: Éditions du Seuil, 1981.
RAMOS, Clélia Regina & GOLDFELD, Marcia. “Vendo Vozes:
os passos dados na direção da realização de um programa de televisão para
crianças surdas” in GELES número 6, Ano 5, Babel, 1992.
REIS, Vania Prata Ferreira. A criança surda e seu mundo: o
estado-da-arte, as políticas e as intervenções necessárias. Dissertação de
mestrado (n.p.). Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, 1992.
REVISTA DA FENEIS. Números 1 ao 13. R.J. 1999/2002.
SACKS, Oliver. Vendo Vozes: uma jornada pelo mundo dos
surdos. Rio de Janeiro: Imago, 1990.
* Resumo do artigo LIBRAS: A Língua de Sinais dos Surdos Brasileiros
Disponível na integra em: www.editora-arara-azul.com.brEditora Arara
Azul Ltda / Fax: (24) 2225.1947 / E-mail: editora@uninet.com.br. Em
Petrópolis - RJ, um espaço dedicado à cultura e à diversidade.
http://librasatividadesnovas.blogspot.com.br/
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