“Olá, meu nome é Cristina Mayorquin Romeiro, tenho 53 anos e sou surda.
Sou implantada bilateral, sendo que o primeiro eu coloquei em 2007
com a equipe do Hospital São Paulo, pelo SUS. Este foi colocado no meu
pior ouvido, o direito. A idéia era que eu continuasse com uso do
aparelho auditivo no esquerdo, mas depois da adaptação com o IC, não
consegui mais. Fiz a segunda implantação pela Unimed em 2012,
em Londrina. Ainda não estou perfeitamente adaptada com este, que é
muito mais moderno que o anterior. Este mês de maio/13 irei à São Paulo
para substituição da parte externa do antigo, para que os dois “falem a
mesma língua”. O SUS está substituindo todos os antigos. Espero que com
isso eu me adapte mais rapidamente ao segundo IC.
A minha família do lado materno têm vários surdos, principalmente mulheres. Minha mãe mora comigo e sempre foi surda (bem menos do que eu) e minha única filha tem 17 anos e usa aparelho bilateral
desde os 13 anos. Cresci com o péssimo exemplo da minha mãe que
“fingia” que escutava e todo mundo falava com ovo na boca. Ela só
colocou aparelho unilateral na terceira idade, e até hoje tem hora que ainda finge que escutou.
Eu morria de vergonha dos foras que às vezes ela dava por não estar
escutando perfeitamente o que se falava. Aqui se faz aqui se paga!
Sou nascida em São José do Rio Preto/SP e vivi lá até os 17 anos. Não me percebia deficiente auditiva,
só depois que fui diagnosticada, eu e uma prima que cresceu e estudou
sempre comigo, descobrimos porque na infância e adolescência ela brigava
tanto comigo. Dizia que eu não prestava atenção ao que ela falava e
para tudo eu respondia: Aham? Ela fazia greve de não repetir mais nada
para mim. Hoje nós rimos muito disso. Bem, com 17 anos passei no
vestibular para nutrição, numa escola federal, no Rio de Janeiro e lá
fui eu. Morávamos em três na república e foi aí que comecei a perceber que era surda.
Na minha casa em Rio Preto era tudo amplificado por causa da minha mãe: telefone,
campanhia e as conversas. Todos falavam (falam) muito alto. Tenho dois
irmãos sem nenhuma deficiência. Pegava carona na surdez da minha mãe, já
que todos falavam alto com ela e não percebi a minha. Mas , quando o telefone do vizinho tocando sem parar, incomodava minhas amigas e eu sequer ouvia, deduzi: tcham, eu também sou surda.
Isso era 1980, fui ao médico, mas como a perda não dificultava minha
vida e a medicina auditiva era incipiente nesta época, nada de
aparelhos, nada de estimulação, só quando piorar,
e isso se deu em 1996, quando coloquei meu primeiro aparelho intrauricular unilateral, já morando em São Paulo.
e isso se deu em 1996, quando coloquei meu primeiro aparelho intrauricular unilateral, já morando em São Paulo.
Também nesta oportunidade meu otorrino em São Paulo, Dr. Luck
, começou a pesquisar se havia algo que pudesse ser feito para
estabilizar a perda. Tudo inútil. Minha fono da vida inteira ( de
aparelho) sempre foi a Cecília Martineli, que adoro.
Bom antes deixe me contar o que fiz de 1982 quando me formei até 1996.
Formei-me em Nutrição e mudei para São Paulo, para trabalhar em Refeição
Coletiva, numa multinacional francesa, onde fiquei por
abençoados 20 anos. Comecei como nutricionista responsável operacional
de restaurantes coletivos, onde fiquei pouco tempo e já fui transferida
para a área comercial, onde fiz quase toda minha carreira. O cliente,
meu interlocutor era o gerente ou o diretor de recursos humanos das
grandes empresas da Grande São Paulo. Em nenhum momento tive
dificuldades no trabalho. Acho que foi nesta época que comecei a ler lábios inconscientemente. Fui chefe, gerente, trabalhei pelo Brasil todo nesta função, com muito sucesso. Em 96 não deu mais. Pedi socorro e foi quando coloquei meu primeiro aparelho.
Algumas mudanças na GR e em 1999 lá fui
eu morar em Salvador, no cargo de Gerente Operacional. Divorciada,
sozinha com minha filha e perdendo a audição rapidamente. Fiquei lá um
ano e fui transferida para Vila Velha/ ES. Lá eu fiquei até 2004. Neste
tempo troquei de aparelho umas tres vezes, sempre por um mais potente e
sempre somente no ouvido esquerdo (o “menos ruim”). Em 2004, me
candidatei para ser representante da Silimed, fabricante brasileira de
implante se silicone. Precisava aumentar meus rendimentos. Passei no
processo seletivo e foi me designada a Unidade de Vendas de Londrina e
Norte do Paraná que até então era atendida por Curitiba e estava sendo
desmembrada. Não conhecia Londrina, nem ninguém, mas em Dezembro de 2004
virei empresária, numa área que totalmente desconhecida para mim e para
implantar um negócio.
Mas, tudo deu certo e aqui estou eu.
Escutei até quando eu já conhecia todos os clientes ao vivo e pelo
telefone (cirurgiões plásticos, e outros). Em 2006 não falava mais ao telefone.
Atualmente falo com meu namorado e minha filha e arrisco alguns
outros,mas, o meu ouvido do telefone no trabalho, banco, TV à cabo,
etc , é a Cíntia , um anjo que Deus colocou em meu caminho e está comigo
há 6 anos. Em 2007 fui implantada. Benção divina!!
Em 2011 realizei um grande sonho:
ficar dias em Paris, sozinha e assistir o famoso torneio de tênis de
Roland Garros. Resolvi tudo sozinha pela internet: passagem, hotel,
ticket para ver um balé na Ópera , ingressos para o torneio, etc. Fiquei
16 dias apenas flanando por Paris. Detalhe: não falo uma palavra de
inglês nem de francês, mas me virei muito bem!
Sempre quis ter uma relação com a surdez diferente da minha mãe, por isso aceitei desde o começo.
Passei muito apertada em algumas ocasiões, como reuniões, viagens,
aeroportos, me estressava e cansava muito por estar sempre alerta (até
hoje é assim). Com isso, minha filha também aceitou na boa, não esconde de ninguém e faz valer seus direitos na escola:
escolhe onde sentar, pede para abaixar ou aumentar o microfone do
professor, namora, mas assim como eu detesta ambiente barulhentos e/ou
com música. Também somos duas leitoras compulsivas!
Hoje posso dizer que apesar dos problemas que acompanham a surdez, como preconceito, discriminação, etc. eu venci! E ainda tenho o privilégio de tirar meus ICs e ficar no silêncio absoluto , que às vezes é uma benção.Paula, o que me inspirou a escrever este depoimento foi seu livro. Parabéns por ele, pelo blog. Temos tão poucas vozes falando por nós. Você é linda, inspiradora e inteligente !
Bjo no coração,
Cristina”
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