“LIBRAS É língua”
“A sociedade surda possui sua própria identidade, história e cultura, e o reconhecimento disso é parte fundamental para a integração e justiça social dos surdos e ouvintes. (GESSER)”
Na década de 1960, foi conferido à língua brasileira de sinais o 
status lingüístico. Diferentemente do que se imagina a língua de sinais 
não é universal, pois varia dependendo da comunidade, território, país… 
Podemos dizer que “o que é universal é o impulso dos indivíduos para a 
comunicação e, no caso dos surdos, esse impulso é sinalizado.”
A língua de sinais dos surdos é natural, pois evolui como parte de um
 grupo cultural do povo surdo. Possui gramática onde, por exemplo, a 
orientação e a configuração da mão podem mudar o significado do sinal, 
assim como apenas uma letra pode diferenciar significativamente uma 
palavra nas línguas orais.
As mãos não são o único veículo usado nas línguas de sinais para 
produzir informação lingüística. Os surdos fazem o uso extensivo de 
marcadores não manuais como, por exemplo, as expressões faciais que se 
tornam importantes elementos gramaticais compondo a estrutura da língua.
As línguas orais e as línguas de sinais são similares em seu nível 
estrutural, ou seja, são formadas a partir de unidades simples que, 
combinadas formam unidades mais complexas. Diferem quanto à forma como 
as combinações das unidades são construídas. Enquanto as línguas de 
sinais, geralmente, incorporam as unidades simultaneamente, as línguas 
orais tendem a organizá-las seqüencialmente e linearmente. Essa 
diferença se dá devido ao canal de comunicação em que cada língua se 
estrutura.
Constantemente atribui-se um status menor, inferior e teatral a 
língua de sinais, quando definido e comparado a mímica. Diferentemente 
das mímicas, que tentam representar um objeto tal como ele existe na 
realidade, a língua de sinais mostra o símbolo convencionado de um 
objeto. Sendo assim, mímica e sinais, se diferenciam drasticamente.
A língua de sinais tem todas as características de qualquer língua 
humana natural. É necessário que nós, indivíduos de uma cultura de 
língua oral, entendamos que o canal comunicativo diferente 
(visual-gestual) que o surdo usa para se comunicar não anula a 
existência de uma língua tão natural, complexa e genuína como é a língua
 de sinais (GESSER, 2009, p. 21-22).
Perpetua-se a idéia de que os surdos não têm língua, não podem 
possuir fala inteligível e de que não tem cordas vocais, sendo que, os 
surdos são fisicamente e psicologicamente normais.
É correto afirmar que através da língua de sinais se consegue 
expressar idéias ou conceitos abstratos, sentimentos, emoções ou 
quaisquer idéias. Da mesma forma que os falantes de línguas orais, os 
falantes de línguas de sinais conseguem discutir filosofia, política, 
literatura, assuntos cotidianos etc. nessa língua, além de transitar por
 diversos gêneros discursivos, criar poesias, fazer apresentações 
acadêmicas, peças teatrais, contar e inventar histórias e piadas.
“Os sinais podem ser agressivos, diplomáticos, poéticos, filosóficos,
 matemáticos: tudo pode ser expresso por meio de sinais, sem perda 
nenhuma de conteúdo (Emmanuelle Laborrit, O vôo da Gaivota)”
Há uma tendência em pensar que a língua de sinais é uma língua 
exclusivamente icônica, e essa visão relaciona-se com o fato de a língua
 de sinais ser uma língua de modalidade espaciovisual. Embora exista um 
grau elevado de sinais icônicos, é importante destacar que essa 
característica não é exclusiva das línguas de sinais. As línguas orais 
incorporam também essa característica.
Os surdos foram privados de se comunicarem em sua língua natural 
durante séculos. Diferentes autores em vários estudos tem apontado a 
difícil relação dos surdos com a língua oral majoritária e com a 
sociedade ouvinte. Historicamente há muitas referencia de luta da 
comunidade surda, pois os surdos não tinham seus direitos respeitados e 
lutaram muito para poder comunicar-se através da sua linguagem.
O alfabeto manual, utilizado para soletrar manualmente as palavras, é
 apenas um recurso utilizados por falantes da língua de sinais o que não
 caracteriza a língua. No Brasil, o alfabeto é composto por 27 formatos.
A língua de sinais tem estrutura própria, é autônoma e independe de 
qualquer língua oral em sua concepção lingüística. Cada língua de sinais
 tem suas influencias e raízes históricas a partir de línguas de sinais 
especificas. Há poucos documentos registrados por surdos, e sobre os 
surdos, que possam fornecer informações sobre a origem e o 
desenvolvimento das línguas de sinais entre surdos. Porém é importante 
dizer que a coabitação da maioria das línguas de sinais com as línguas 
orais faz com que empréstimos, alternâncias e trocas lingüísticas 
aconteçam, inevitavelmente.
Existe uma discussão a respeito dos conceitos de surdez e de como as 
pessoas com essa característica gostam de ser chamadas. Aparentemente, 
pensava-se que o termo “deficiente auditivo” seria o melhor, até 
perceber-se que estes preferiam ser chamados diretamente de “surdos”, o 
que corresponderia melhor à realidade. Da mesma forma, o termo 
“surdo-mudo” é um equívoco produzido pelo paradigma médico, à medida que
 os surdos possuem capacidade oratória e podem falar, se treinados para 
tal.
Uma importante atenção deve ser dirigida aos intérpretes dos surdos, 
que muitas vezes, surgem por conveniência, necessidade, ou urgência. A 
lei 10.436 regulamenta a presença de intérpretes para surdos em espaços 
institucionais. Contudo, o intérprete não pode ser visto como “a voz do 
surdo”, pois este possui autonomia.
O mundo dos surdos não é um mundo de silêncio absoluto. Entretanto, o
 silêncio é relativo. Eles escutam com os olhos, sendo que, quando estão
 em um ambiente onde muitas pessoas estão fazendo sinais ao mesmo tempo,
 ou mesmo falando e fazendo expressões, sentem que estão em um ambiente 
barulhento. Isso pode ser chamado de “ruído visual”. Além disso, é 
preciso entender que a língua de sinais é uma forma de falar (mas que 
não necessita emitir som). O mesmo acontece com a música e a dança: é 
possível senti-las e apreciá-las através da observação de movimentação, 
da vibração, do contato corporal, etc.
A escrita, por sua vez, demanda um desafio para o surdo, visto que 
ele não está familiarizado com essa realidade fônica. Porém, com boas 
oportunidades e qualidade de ensino adequadas, os surdos tem plena 
capacidade de aprender a língua escrita. Assim como, de maneira alguma o
 aprendizado da língua de sinais dificulta o aprendizado da língua oral.
 Pelo contrário: facilita. O desenvolvimento cognitivo e lingüístico do 
indivíduo também não é prejudicado se ele possuir acesso e uso à língua 
de sinais nos ambientes em que vive.
O surdo não precisa falar para estar inserido no mundo dos ouvintes. A
 oralização pode trazer uma série de preconceitos contra os surdos, e 
tal preconceito está impregnado na história da sociedade surda. Por esse
 motivo existe do outro lado, também, um preconceito de alguns surdos em
 relação à língua oral. O surdo pode conviver tranquilamente com 
ouvintes. Porém, para que possa sobreviver, é necessário que ele possua a
 língua de sinais. Ademais, não são todos os surdos que sabem fazer 
leitura labial, sendo essa uma afirmação errônea.
É importante entender que a surdez não se constitui como um problema 
ou deficiência para o surdo. Pois de maneira geral, ele a encara de 
maneira natural, assim como os ouvintes encaram sua audição de maneira 
natural. Não deveria ser vista como uma deficiência, apenas como 
alteridade, diferença, diversidade, pois o surdo não tem nada a menos 
que o ouvinte.
Quanto aos aspectos fisiológicos, existem diferentes tipos e graus de
 surdez. As escolhas em relação ao uso da língua de sinais ou da 
aprendizagem da língua oral, variam de indivíduo para indivíduo, não 
existe regra para definir que todo tipo de perda auditiva é considerada 
surdez. Os aparelhos auditivos não devolvem a audição, apenas amplificam
 sons que já são ouvidos em menor volume, e nos casos de alguns surdos 
profundos, os ruídos produzidos por estes aparelhos pode ser um grande 
incômodo. Algumas intervenções cirúrgicas tem sido experienciadas, mas o
 sucesso e satisfação varia muito conforme a situação e características 
do sujeito envolvido, sendo que normalmente o processo não é tão 
satisfatório quanto os ouvintes afirmam ser.
Levando em conta tudo que já aconteceu e está acontecendo com a 
cultura surda, suas conquistas e avanços, é possível afirmar que estamos
 passando por um momento singular. Apesar disso, ainda é necessário 
lutar contra a hipocrisia e desigualdade que mascaradamente permuta o 
meio político e social da sociedade ouvinte em relação aos surdos. As 
dificuldades que ainda existem certamente não serão facilmente 
transpostas, mas os esforços históricos e recentes tem mostrado que 
podemos ser otimistas e acreditar que é possível construir uma sociedade
 mais justa, igualitária, e que respeite as diversidades.
Resumo do livro:
GESSER, Audrei. Libras que língua é essa: crenças e preconceitos em torno da língua de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola Editorial, 2009. 87p.
 http://psidaianagallas.wordpress.com/2013/01/17/libras-e-lingua/

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