A deficiência auditiva e os nossos novos relacionamentos
Esses dias troquei uns emails com uma leitora das antigas que eu admiro muito. Um dos tópicos da nossa conversa foram os relacionamentos – em especial, logicamente, os amorosos.
Aí acabei matutando sobre esse assunto, e vi que dá pra entender porque
tantas pessoas que não escutam preferem muitas vezes se fechar num
grupinho de pessoas com as quais se sentem confortáveis e não sair mais
dali. Sim, é confortável, tranquilo e não causa stress. Só que, cá entre
nós, qual é a graça? A gente fala tanto em diferença e na hora do pegapacapá acha melhor ficar entre iguais?
A cada relacionamento que chega ao fim
(fazer o que, né!) nos deparamos novamente com aquela missão um
pouquinho desagradável, que é contar para uma pessoa nova sobre nossa deficiência auditiva e suas peculiaridades. No meu caso, em 100% das vezes foram pessoas que ouviam normalmente – nunca me relacionei com alguém que tivesse o mesmo problema. Embora pareça uma baita bobagem, é difícil não bater um receio. “Vai
entender numa boa?”, “Vai sair correndo?”, “Vai saber lidar com
isso?”, ”Vai ter paciência”?, “Vai me olhar como se eu fosse um alien?”,
“Vai ficar constrangido?”…São as perguntas clássicas que ficam passando pela nossa cabeça.
Comigo já aconteceu cada uma! Lembro de
uma vez – já devo até ter contado aqui – em que um carinha pediu meu
telefone. Quando dei o número pedi que só me mandasse SMS, não ligasse.
Aí tive que ouvir um discurso da criatura, que me acusou de ser casada
(pode???) e estar falando pra ele mandar SMS só pro meu ‘marido’ não
saber. Só Jesus na causa, como diria aquela personagem da novela das 8.
Outra vez, quando contei que não ouvia bem, a criatura em questão ficou
uns 10 minutos tipo “ahhh não mente”, “ahhh fala sério”, até acreditar. Peloamor!!! Enche o saco, mas acontece e muito.
Porque é que temos tanto receio, afinal?
No meu caso, demoro pra decidir se uma pessoa nova merece ou não merece
saber demais sobre a minha vida nesse quesito. O que é que um namorado
novo precisa ter para lidar numa boa com a deficiência auditiva?
Paciência. Sejamos honestos, é preciso uma dose enorme de paciência para
se relacionar com alguém que não ouve bem. Isso envolve repetir algumas coisas quando for necessário (sem fazer cara de bunda e sem reclamar, rsrsrs), aprender truques básicos como não querer bater papo no escuro, aprender o mínimo aceitável de leitura labial (se virar expert eu me apaixono e caso! hahaha) e, porque não, ajudar a transformar esse peso em leveza. A surdez me lembra o título daquele livro famoso, “A insustentável leveza do ser“,
cuja principal lição é a de que devemos aprender a transformar o peso
da vida em leveza. E não é isso que fazemos todo santo dia ao reunir
forças para não nos estressarmos (tanto!) com o fato de que não ouvimos
perfeitamente? Que delícia quando conseguimos encontrar alguém que nos
ajuda com isso.
É primordial que a gente se sinta confortável e 0% constrangido com tudo o que disser respeito à DA quando nos relacionamos com alguém. Já recebi centenas emails de leitores do Crônicas reclamando do comportamento de namorados(as), maridos e esposas. Eu jamais conseguiria me relacionar com uma pessoa que me fizesse sentir mal ou envergonhada/sem graça
em função disso – cairia fora no ato. Há quem consiga, mas,
honestamente, acho isso uma tremenda falta de amor próprio e um
desperdício de tempo.
http://cronicasdasurdez.com/
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